Quem é Simão Bacamarte

por Sérgio Trindade foi publicado em 17.fev.19

O verdadeiro Simão Bacamarte, personagem criado pelo genial Machado de Assis, é um médico que conquistou respeito no Brasil e no exterior e que, de volta à sua terra natal, Itaguaí, dedicou-se aos estudos de psiquiatria, construindo na cidade um manicômio batizado como Casa Verde, que abrigou, inicialmente, os loucos da cidade e da região e que, paulatinamente, abrigou, por loucura do doutor Bacamarte, qualquer pessoa que, de alguma forma, causavam-lhe espanto.

Quando 3/4 da população da cidade estava internada na Casa Verde, Simão Bacamarte resolveu rever os seus princípios teóricos, pois, passou a pensar, se a maioria apresentava desvios de personalidade e não seguia um padrão, então louco era quem mantinha regularidade nas ações e possuía firmeza de caráter; pensando assim, o médico logo recomeçou a internar as pessoas da cidade, até que percebeu novamente estar sua teoria incorreta, o que o faz mandar soltar todos os internos mais uma vez.

Como ninguém na cidade tinha uma personalidade perfeita, exceto ele próprio, Simão Bacamarte concluiu ser o único anormal e decidu trancar-se sozinho na Casa Verde para o resto de sua vida.

Do Simão Bacamarte verdadeiro brotou um falso, com todos os defeitos do original e sem a sua virtude final.

O Simão Bacamarte fake também cercou-se de soldadinhos de chumbo dispostos a fazer o mais vil dos papéis, desde que sejam mimoseados com cargos, viagens e agrados variados.

O Simão Bacamarte fake é um perfeccionista da imperfeição gerencial que só ele e a claque que o cerca vê como a mais perfeita superintendência criada e executada.

O Simão Bacamarte fake é o principal artífice da democracia que não aceita a divergência, o contraditório, a liberdade de reunião, a liberdade de expressão, a liberdade de manifestação.

O Simão Bacamarte fake é o mais bem acabado intolerante que se pinta como a mais lídima encarnação da tolerância e da convivência entre os contrários.

O Simão Bacamarte fake é a síntese do burocrata que vê na burocracia o entrave necessário para atrapalhar a vida de todos que não lhe são agradáveis.

O Simão Bacamarte fake é o legislador do impossível, o jurista maníaco, o executivo mambembe.

O Simão Bacamarte fake não é louco como o original. É medíocre legislador, perverso rábula e executivo sicário numa combinação extravagantemente nociva e patológica para inocular a desarmonia, medo e pânico.

O Simão Bacamarte fake não tem a grandeza d’alma do personagem machadiano, que, depois de muito maltratar a todos com sua insanidade, isolou-se no hospício por ele construído para abrigar loucos e que, por loucura do seu construtor e diretor, transformou-se num depósito para o qual são enviados todos aqueles que o médico, baseado em seus pressupostos teóricos, julgava dementes e desatinados.

À figura caricata de Simão Bacamarte faltava um toque de civilização, dado por Zorba, que a ele se associou para construir um projeto de democracia que só funciona em livros embolorados e em mentes doentias. A democracia que suprime a liberdade em prol do controle total.

O Simão Bacamarte fake não é um alienista, mas um alienado. É um trôpego diretor de escola auxiliado por um jactancioso professor de cálculos, Zorba, especialista na arte de, com pompa e circunstância, falar para nada dizer e exaltar a si mesmo.

Com ele esteve o vaidoso conselheiro Amâncio, intelectual e polígrafo que se expressa por chavões, frases vazias e citações aos montes. Símbolo, na essência, do bacharelismo oco, Amâncio primava pelas obviedades e pelos discursos professorais que quase sempre começavam com “Porque no capitalismo…” ou “Como dizia fulano…”.

Gravitou em torno do trio um ajuntamento de obreiros obedientes bem aquinhoados, dispostos a quase tudo para continuar chupando as tetas cada vez mais esquálidas da marafona que os sustenta.

O que falta ao Simão Bacamarte fake é empatia. E por não carregá-la, ele atolou a escola que um dia foi querida por muitos que lá trabalharam num campo de concentração donde era necessário fugir.

Aos heróis que lá permaneceram lutando contra o coronel de hospício desejo sucesso.

 

 

 

Por Sérgio Trindade

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