A política das cuecas
O Brasil não é mesmo um país para amadores, como dizia Tom Jobim.
Quando um assessor do deputado federal José Guimarães, do Partido dos Trabalhadores (PT), foi pego, em 2005, com US$ 100 mil dólares escondidos na cueca, nós achamos que o Brasil descera ao ponto mais vil. https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2019/10/22/arquivamento-da-investigacao-do-caso-dos-dolares-na-cueca-e-negado-pela-justica-no-ceara.ghtml
O então deputado federal Jair Bolsonaro questionou várias vezes, na câmara federal, a atitude do assessor petista. https://epoca.globo.com/brasil/bolsonaro-questionou-dinheiro-na-cueca-em-cinco-discursos-como-parlamentar-24693868
O tempo tratou de mostrar que o fundo do poço, para o Brasil, está sempre um passo mais à frente.
Esta semana o vice-líder do governo Bolsonaro, o senador Francisco Rodrigues, de Roraima, apareceu com mais de R$ 30 mil reais escondidos na cueca e do montante R$ 15 mil atolados no meio das nádegas. https://extra.globo.com/noticias/brasil/pf-apreende-dinheiro-na-cueca-de-vice-lider-do-governo-bolsonaro-em-operacao-sobre-desvios-em-verba-do-covid-19-24692611.html
A Polícia Federal (PF) registrou tudo em vídeo.
O episódio me lembrou inicialmente o gato que descome dinheiro d’O auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, mas logo meus pensamentos seguiram para Papillon, registro memorialístico do francês Henri Charrière.
Para quem não sabe, Papillon era o apelido do francês Henri Charrière, condenado ao degredo perpétuo em possessão francesa no continente americano e que se tornou mundialmente famoso, no final da década de 1960, ao publicar livro com título inspirado em seu apelido e no qual contou a sua fuga espetacular, ocorrida em 1935, da Ilha do Diabo, complexo de presídios que a França mantinha na Guiana Francesa.
O sucesso foi ainda maior quando a história chegou ao cinema, em 1971, com Steve McQueen no papel principal (há nova versão, bem menos empolgante, de 2017, com Charlie Hunnam no papel principal).
Na versão tupiniquim, o senador por Roraima, Francisco Rodrigues, encarna Henri Charrière de forma muito mais escatológica e depravada, pelo menos no quesito esconder dinheiro no traseiro.
O francês Charrière guardava numerário num tubo de metal e o escondia no intestino, introduzindo-o pelo ânus. Assim impedia que os seus inimigos de presidio pudessem roubá-lo facilmente – e ainda evitava que as notas ficassem sujas de fezes.
Ousado e intrépido, Rodrigues, a Libélula Brazuca, abriu mão do tubo de metal e aninhava somas consideráveis, em notas de R$ 200, entre as nádegas.
O volume era tal que, suspeito, o senador nortista deve ter entre as partes um Grand Canyon (Arizona) que fará inveja ao dos Estados Unidos.
O governo federal deveria retirá-lo da vice-liderança e escalá-lo como cofre forte do Banco Central. Ali, pelo que pressinto, há espaço para acomodar todo o dinheiro do Tesouro.
Como disse alguém no Twitter, o dia foi triste para aqueles “que contam dinheiro molhando o dedinho na língua.”
Culpa do novo normal.