Craque ausente, causa urgente
O texto abaixo é do amigo, irmão, Rubens Lemos Filho, um dos grandes cronistas do Brasil
Craque ausente, causa urgente
Absoluta franqueza em assumir meu pânico. Vivo assombrado diante do Coronavírus. Pela minha vida menos do que pelas vidas dependentes da minha. Cada dia, uma batalha psicológica.
É um teste torturante trovejando em paralelo com duas desgraças a mais: o noticiário colado à insanidade ideológica e a falta de um líder para tomar conta de tudo com patriotismo e, sobretudo, autoridade respeitosa.
O Brasil é tão azarado que o último homem público dimensional aqui produzido morreu sem tomar posse a 21 de abril de 1985, quando eu tinha 14 anos. Chorei muito por Tancredo Neves e depois fiz 15 anos. Tancredo era um liberal sensível e malandro, mas condutor sábio e macho sem arroubo, de qualquer processo político, em especial nas crises.
Corajoso, Tancredo peitou os conspiradores do seu líder e mestre Getúlio Vargas sem conseguir impedir a traição do vice, o potiguar Café Filho, aliado a militares em jogo duplo.
Tancredo não evitou o suicídio de Getúlio nem pôde conduzir com a maestria do enxadrista político, as trapalhadas médicas que abreviaram sua morte e sepultaram esperanças para nenhum dia.
Tancredo teria, sem emitir um rugido déspota, a solução da vacina, conciliando, conversando, argumentando, convencendo, mobilizando. Hoje temos extremistas sem razão em lado algum, trocando ataques da mais surrada falácia eleitoral, fingindo preocupação com milhares de mortos.
Morto nem rima assim com voto, o antídoto que realmente interessa aos atores políticos das nefandas Direita, representada por um desrespeitoso contumaz, acima do agressivo, fruto de revolta da classe média tonta contra as barbaridades cometidas pelo representante da Esquerda Furiosa, ex-trabalhador que virou líder de seita e provou ser um demagogo de estampa, eticamente ilimitado para satisfazer seus desejos dominadores.
Estamos sós, dentro de cada um e esta é a peleja mais grave do Pós-Guerra. Falta o técnico, com a estratégia, a defesa, com as precauções para frear o avanço da peste, o meio-campo para planejar com ciência dissociada de militância e o ataque com a sensibilidade humana e a expertise gerencial de buscar a vacina.
Não há ninguém, na política atual, capaz de conduzir o fim do caos agindo de gerente de crise, como o meia-direita e esquerda que Tancredo foi ao longo de sua vida, alguém para decifrar os enigmas impossíveis dos filmes de mentira absoluta.
Todos estamos assistindo Tom Cruise, Steven Seagal e o velho Charles Bronson, o bem de trituradora e tela grande. Para fugirmos do ataque invisível letal de um assassino covarde e competente, atuando nas fendas de burrice dos imbecis transformados em autômatos de discursos venenosos, furiosos, coléricos. De dois lados teleguiados. Por um inconsequente e um vigarista de risada cínica .
Estou conversando todo dia com um amigo, quase meu pai, homem experiente. Noto sua angústia por uma causa nobre e não resolvida , como são jogadas no deixa para amanhã, as prioridades que não rendem mídia.
É um caso especial. Será solucionado. Pois, se não há Tancredo, o agasalhador, haverá Romário, o gênio porco-espinho, que sacudirá o Congresso a ponto de derrubá-lo, se faltar vacina a quem tem Síndrome de Down. Romário é pai de uma filha com Down, engajado na causa coletiva além de detector de pilantras. Aos meus amigos(há outro), sertanejo legítimo de atitude, pai de uma pedra preciosa apaixonante de tanto carisma, a fé de que a causa deles é maior que a crueldade dos fariseus. Como Tancredo sempre foi. Baixinho em porte físico. Gigante em coragem e altivez.