O Master caso financeiro: uma coreografia de poder, prestígio e prudência tardia

por Sérgio Trindade foi publicado em 28.nov.25

O Caso Master talvez seja o episódio mais didático da temporada recente da política e da economia brasileira. Não somente por suas enormes cifras, mas também por aquilo que revela sobre as relações entre Estado, mercado e o vale-tudo dos intermediários. O diagrama das conexões mostra um país no qual bancos conversam com agentes do Estado, agentes do Estado conversam com bancos e ambos se cruzam num terreno onde a fronteira entre influência e imprudência é, no máximo, uma linha pontilhada.

No centro do enredo está o Banco Master, comandado por Daniel Vorcaro, cuja ascensão meteórica encontrou vento favoráveis de todos os quadrantes. O banco orbitava atores dos dois grandes condomínios da política brasileira: gente do PT, do PP, do União Brasil, além de ex-ministros, magistrados, consultores de prestígio e operadores com trânsito em vários governos. O mapa de relações mostra que o Master não era um banco isolado no ambiente financeiro, mas uma espécie de hub político-financeiro, no qual cada fio levava a um gabinete, um plenário, uma secretaria ou um escritório de advocacia.

Imagem feita com auxílio de IA

A proximidade com o PT da Bahia, por exemplo, vinha por meio de lideranças estaduais e federais. Esse eixo colaborava para abrir portas, mediar interesses e criar um ambiente político confortável ao banco. Já no campo do Centrão, as pontes eram igualmente funcionais. Parlamentares influentes, alguns deles com enorme capacidade de moldar emendas, atuavam na vizinhança institucional do Master, inclusive apresentando propostas que, segundo o diagrama, poderiam beneficiar diretamente o banco.

No bloco oposto do espectro político, o enredo também florescia. Ex-integrantes do governo Bolsonaro, figuras com trânsito na área econômica e de comunicações, apareciam como pontos de contato relevantes. A lógica era clara: onde houvesse governo, havia uma porta para bater – e o Master, claro, tinha as chaves certas.

Mas é no desenho envolvendo o BRB (Banco de Brasília) que a ópera ganha seu segundo ato. O BRB aparece como instituição crucial na tentativa de absorção do Master, com o aval – ou ao menos a iniciativa – de atores com controle direto sobre o banco. Ali se forma um triângulo peculiar entre o controle político do Distrito Federal, a administração do BRB e os interesses do Master. O cruzamento é tamanho que, quando o caso explode, executivos do BRB e autoridades locais passam a figurar no mesmo tabuleiro de investigações.

O terceiro vértice é o BTG Pactual, cujo chairman e sócio sênior aparece no diagrama como figura com interlocução privilegiada em vários centros de poder. O BTG, nesse contexto, presta serviços jurídicos, participa das costuras institucionais e, colateralmente, figura entre os atores acompanhando a negociação que envolvia o Master, o BRB e o Fundo Garantidor. Não há, aqui, acusação automática; o que existe é a constatação de que todo grande caso financeiro no Brasil cria uma força gravitacional que traz para perto as maiores instituições.

Enquanto isso, o Banco Central (BC), teoricamente o árbitro neutro da partida, o VAR do sistema financeiro, tinha diante de si um problema regulatório monumental. A relação entre os atores políticos, os bancos envolvidos e a operação de absorção do Master exigiam do BC técnica e, mais ainda, coragem. O órgão recebe as peças, examina os fluxos e acaba dizendo “não”. A decisão de barrar a compra e, posteriormente, liquidar o Master parece, à luz do diagrama, menos um ato de dureza e mais um gesto de contenção para impedir que relações mal explicadas contaminassem o sistema.

O caso todo não é sobre um banco. É sobre o ecossistema que permitiu que o banco existisse assim, conectado a partidos rivais, governos adversários, operadores experientes e instituições poderosas. O país funciona (ou desfunciona) nesses círculos concêntricos. O Master ruiu e carregou consigo uma infinidade de personagens de proa da política e economia brazuca, puxou um novelo que hoje desembaraça conexões, muda rotinas de compliance e revela que, na política brasileira, as relações importam mais que as planilhas.

E o mais grave não é descobrir isso, mas perceber o quanto já sabíamos.

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