A trupe dos virtuosos hipócritas

por Sérgio Trindade foi publicado em 05.ago.25

O Brasil é um país em que os canalhas e os hipócritas se vestem de vestais. Conheci e convivi com muitos, inclusive no trabalho. É um país onde o hipócrita se olha no espelho e jura que vê um apóstolo.

Donald Trump é apontado por muita gente como um bufão de terno caro e cérebro mofado, que finge ser defensor da democracia com o mesmo entusiasmo com que um bode tenta se passar por uma orquídea.

Petistas e bolsonaristas – esses dois lados da mesma moeda suja – fazem pose de democratas, enquanto afagam ditaduras como quem afaga um cão de estimação raivoso. E o brasileiro apaixonado por essas turmas? Ah, esse aplaude de pé, entre lágrimas e convulsões patrióticas, a farsa de seus heróis.

Em um teatro do absurdo tropical, petistas e bolsonaristas – inimigos de fachada – compartilham a mais escandalosa das afinidades: o amor envergonhado por ditadores. D passado e do presente. Uma paixão clandestina, dessas que se vivem no escuro, à meia-luz, com as cortinas fechadas. Eles gritam DEMOCRACIA em horário nobre, mas cochicham autoritarismo nos bastidores.

Os petistas, por exemplo, jamais esconderam seu flerte com os tronos bolivarianos da atualidade ou a paixão pelas castrismo que enterrou Cuba numa longeva e miserável ditadura de tinturas socialistas. Lula, Dilma e outros devotos do altar vermelho viveram a ilha de Fidel Castro como se fosse a Disneylândia da igualdade, quando era – e é – um cemitério de liberdades.

A ditadura cubana, com seus presos políticos e sua imprensa domesticada, era – e é – tratada como uma espécie de experimento social com problemas de comunicação. Quando questionado, Lula divaga, desconversa, solta sofismas e falácias… Claro, melhor julgar com os olhos da Sibéria.

O mesmo raciocínio vale para a Venezuela de Chávez e Maduro, onde se fraudam eleições como quem compra pão na esquina, e para a Nicarágua de Ortega, onde os opositores somem como se evaporassem. Mas para o petismo, tudo é culpa do imperialismo, do colonialismo, do neoliberalismo, do signo de Capricórnio.

Do outro lado do picadeiro, os bolsonaristas oferecem seu aplauso aos generais de ontem e aos autocratas de hoje. Jair Bolsonaro, em vez de governar, passou quatro anos saudando o fantasma de 1964, como quem acende vela para um santo vingativo. Chamou o torturador Brilhante Ustra de herói nacional com uma devoção de altar. Seus filhos – esses meninos que nunca aprenderam a calçar o sapato sozinhos – falavam em AI-5 como quem fala em sanduíches e sorvetes. Para eles, a democracia só vale quando cala os inimigos. Putin bombardeia, Orbán censura, Trump delira… nada a reclamar. Está tudo bem. É liberdade à moda da casa, com fuzil na mão e leis no lixo.

Ambos, petismo e bolsonarismo, justificam seus amores tirânicos com a mesma lógica maniqueísta de folhetim de quinta categoria. A esquerda diz: “Precisamos defender os nossos contra o imperialismo capitalita!”. A direita rebate: “Precisamos defender os nossos contra o comunismo globalista!”. E nessa dança de máscaras, a democracia vai sendo violentada, currada, estuprada por turnos – um dia pelo PT, no outro pelo clã Bolsonaro. Cada qual com seus carrascos de estimação e seus rapapés ao autoritarismo de seus desejos.

Imagem gerada com auxílio de IA

A verdade – essa senhora feia que ninguém quer convidar para sair – é que, no Brasil, a democracia só serve enquanto não atrapalha. Quando se torna incômoda, joga-se fora. Com a mesma facilidade com que se joga um cachorro velho no acostamento. Em nome da guerra santa contra o outro lado, justificam-se torturas, censuras, exílios e desaparecimentos. E o povo – esse andrajo apaixonado – bate palmas para o homem forte, como se o chicote fosse uma bênção.

Ao fim e ao cabo, petistas e bolsonaristas marcham juntos, de mãos dadas, por uma estrada pavimentada com mentiras, idolatrias e desprezo à liberdade. São irmãos siameses na hipocrisia. E nós, os espectadores, assistimos à peça como sempre: com a cara de quem aplaude o próprio algoz.

Por Astério de Natuba

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