A vez e a hora do centro

por Sérgio Trindade foi publicado em 05.fev.25

Já fui, por duas décadas, um disciplinado militante de esquerda, mas nunca fui um militonto, porque em momento algum rezei cegamente pela cartilha de qualquer ideologia ou partido político.

Cansado da safadeza e do cinismo da esquerda brazuca, fui migrando progressivamente da esquerda para o centro entre o final dos anos 1990 para o início dos anos 2000, no entanto segui – e me penitencio por isso – votando em candidatos do PT por mais de uma década neste século. Somente em 2014 deixei de fazê-lo, quando iria digitar Eduardo Campos, pai do tiktoker João Campos, atual prefeito e Recife, e terminei votando em Marina Silva, sua substituta no pleito e atualmente ministra do governo Lula.

Sou, há uma década, um empedernido eleitor do centro político. Votarei, novamente, em um candidato que se apresente defendendo pautas moderadas e vejo, com certa alegria, as pesquisas de opinião indicarem que o eleitorado brasileiro se encontra dividido em três fatias quase iguais: esquerda, centro e direita.

Embora siga polarizado entre Lula e Bolsonaro – cada um com algo em torno de 30% dos eleitores –, há  novidade nos números: o reaparecimento gente disposta a não aderir aos extremos que hoje se enfrentam.

Será competitivo o candidato que souber ouvir o que esse pedaço centrista do eleitorado diz e consiga com ele se comunicar. Antes, porém, o grupo no entorno de tal candidato deve ser capaz de articular uma frente política que se oponha aos polos que hoje disputam a primazia política no país. O líder já está por aí, falta por ora sintonia entre ele e as correntes políticas e entre ele, as correntes políticas e o eleitorado que pretendam representar; isso só se efetivará se o(s) líder(es) fizer(em) uma conclamação aos seus correligionários para que articulem as forças para romper as franjas dos núcleos lulista e bolsonarista.

Não adianta querer penetrar o núcleo duro lulista e bolsonarista. Fanáticos, apaixonados e interesseiros não são convencidos com argumentos racionais e com moderação. Só é possível destruir a unidade dos polos pelas bordas, apresentando um programa minimamente palatável a elas (as bordas dos polos), sem abrir mão da essência das pretensões centristas. Feito isso, o candidato surgirá no seio dessas forças.

O momento ideal para a ação é 2025 como preparação para 2026. O tempo é curto, porém não é racional abrir mão de 2026 e aguardar 2030, porque 2030 e todos os pleitos seguintes passam por 2026. É agir como os romanos, para quem todos os caminhos levavam a Roma. Todas as eleições passam por 2026.

A construção de um regime democrático passa pela pluralidade. Se assim é, o regime político brasileiro não é uma democracia plena, liberal. Também não é uma ditadura, como querem fazer crer os que a ele se opõem, mas um regime populista com viés ligeiramente autoritário, o qual mimetiza um modelo democrático, porquanto os nossos direitos individuais existirem com muitas restrições.

Lula foi eleito em 2022 prometendo acabar com a polarização, mas só a incentiva, quando não perde a oportunidade de citar Jair Bolsonaro. O Supremo Tribunal Federal, umas das três pernas do Estado, trouxe para si nacos das atribuições dos outros dois poderes e atua como uma espécie de poder moderador sem a moderação necessária para a tal. Bolsonaro, o adversário dos sonhos de Lula, já demonstrou que tem pouco compromisso com a construção de uma democracia de feição liberal.

Se os dois polos se comportam com pouco apreço pela senda democrática, o caminho para a construção de um consenso verdadeiramente democrático deve estar equidistante dos polos que se digladiam.

É a hora e a vez de Augusto Matraga, memorável conto de João Guimarães Rosa que enfatiza dois elementos inseparáveis da vida sertaneja, a violência e o misticismo, numa peleja sem fim entre o bem e o mal.

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