Omissão, esquecimento, ingratidão…

por Sérgio Trindade foi publicado em 09.jun.25

As emendas parlamentares individuais são como bilhetes de loteria no teatro da política brasileira. São instrumentos oficiais, legais, previstos no rito legislativo por meio dos quais deputados e senadores podem direcionar verbas do orçamento federal para suas bases eleitorais, por obrigação afetiva, eleitoral e, também, por instinto de sobrevivência política.

Cada parlamentar tem o poder de lançar sua emenda sem pedir bênção a ninguém. E esse poder é um dos principais mecanismos de descentralização dos recursos públicos. O dinheiro sai de Brasília aos pedaços para as bases eleitorais dos parlamentares.

Desde a Emenda Constitucional nº 86/2015, as emendas se tornaram impositivas. Agora o governo federal é obrigado a cumpri-las, até o limite de 1,2% da receita corrente líquida do ano anterior. Metade disso deve ir para a saúde. O resto é destinado a obras de todos os tipos – escolas, ginásios ou quadras de esportes, praças públicas, etc.

Grande parte desses recursos foram destinados a instituições de ensino.

O deputado Benes Leocádio (União Brasil–RN) tem encarnado o papel de um dos benfeitores do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). Como coordenador da Bancada Potiguar, ele não economizou empenho em destinar emendas para a instituição. E não era pouca coisa. Abriu cofres e articulou apoios para levar recursos aos campi e mesmo à Reitoria. Laboratórios, centros de pesquisa, assistência estudantil receberam atenção do parlamentar.

Em fevereiro de 2021, o palco foi o Centro de Convenções de Natal. O reitor e a pró-reitora de Planejamento e Desenvolvimento Institucional foram convidados por Benes. Tratava-se de decidir o destino de cerca de R$ 13 milhões em emendas de bancada. Lá também estavam a senadora Zenaide Maia e os deputados Beto Rosado e Natália Bonavides. Resultado: o IFRN recebeu sua fatia do bolo: laboratórios em Mossoró, reformas em Canguaretama, acessibilidade em São Paulo do Potengi. Tudo devidamente registrado na página da instituição ((https://portal.ifrn.edu.br/campus/reitoria/noticias/ifrn-apresenta-sugestoes-de-projetos-para-emendas-parlamentares/?utm_source=chatgpt.com). E em julho, novo ato: o programa IFRN: presente! levou Benes à Reitoria, com promessas renovadas para o campus João Câmara (https://portal.ifrn.edu.br/campus/ipanguacu/noticias/201cifrn-presente-201d-instituicao-recebe-parlamentares-para-debater-acoes-e-emendas/?utm_source=chatgpt.com).

Ainda no orçamento 2020-2021, Benes destinou R$ 250 mil de emenda individual ao IFRN. Da cota coletiva, saíram mais R$ 2,95 milhões. A justificativa da pró-reitoria de Administração é um hino à objetividade burocrática: “os recursos atendem obras, reformas, materiais permanentes e de consumo, beneficiando toda a rede do IFRN” (https://portal.ifrn.edu.br/campus/reitoria/noticias/gestores-buscam-parlamentares-para-discutir-recursos-orcamentarios/?utm_source=chatgpt.com).

Em março de 2025, novo capítulo. Benes, infatigável, destinou R$ 600 mil ao IFRN, focando em Lajes e Ipanguaçu. Infraestrutura turística, pavimentação, equipamentos — e, claro, a educação técnica como pano de fundo. No meio da dança das emendas, havia dinheiro para tudo: R$ 1,5 milhão para construir casas populares em Lajes, R$ 350 mil para a Polícia Rodoviária Federal, R$ 200 mil para o artesanato, outros R$ 200 mil para a indústria têxtil — e R$ 600 mil, novamente, para o IFRN, conforme registrou a Tribuna do Norte (https://tribunadonorte.com.br/politica/recursos-para-todas-as-regioes-do-rn/?utm_source=chatgpt.com).

O mandato de Benes Leocádio é, portanto, um desfile de emendas, uma missa contínua em favor do IFRN. Fez chover dinheiro: para laboratórios, refeitórios, acessibilidade, tudo. Visitou reuniões, participou de planejamentos, ofereceu números como quem distribui bênçãos. Seu compromisso com a educação técnica é visível, palpável, quase litúrgico, conforme é possível verificar na planilha que segue (Recursos destinados pelo Dep Federal Benes Leocádio ao IFRN).

Mas aí, meus três ou quatro leitores, vem o drama maior. A tragédia cotidiana. A bofetada. A ingratidão.

A gratidão, essa virtude em extinção, não compareceu. O IFRN, instituição vetusta e ilibada, esqueceu o nome de seu benfeitor. Nas páginas da casa de ensino quase nenhuma menção a Benes — salvo como líder de bancada. Nenhuma vírgula de louvor, nenhum agradecimento protocolar. Tudo documentado nos links, nos autos, nas entrelinhas.

Talvez – só talvez! – o IFRN padeça da mais brasileira das doenças: a seletividade ideológica. Gratidão aos amigos políticos, silêncio aos desafetos e adversários. Se este escriba maldito não estiver equivocado, os gestores da casa educacional faltaram à missa do reconhecimento. E, assim, o drama termina como em toda boa peça trágica: com o bem esquecido, o mal maquiado e a plateia em silêncio.

 

posts relacionados
Logo do blog 'a história em detalhes'
por Sérgio Trindade
logo da agencia web escolar