A Bola, sua Majestade Soberana
A primeira partida da final do campeonato estadual do Rio Grande do Norte, ontem, na Arena das Dunas, entre América e ABC me remeteu aos anos de 2011 a 2013, quando coordenei um projeto de extensão vinculado à Rádio Comunitária Santa Rita, então sob o comando do saudoso Hugo Tavares, na cidade de Santa Cruz do Trairi.
Participávamos eu, os professores da rede estadual Marcos Valflan e João Bezerra e mais algumas pessoas, entre elas um aluno do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) e o filho de João, respectivamente narrador e responsável pela parte técnica da rádio.
O projeto consistia em um programa esportivo diário, com uma hora de duração (12:00 às 13:00), e da cobertura de todos os jogos do time local no campeonato estadual (em um dos anos também fizemos a cobertura da primeira fase da Copa do Brasil).
Eu fazia as vezes de comentarista nos jogos e nas resenhas esportivas diárias.
Certa feita, noite de quarta ou quinta-feira, estava eu comentando um terrível Santa Cruz X Potyguar, sofrendo horrores e já pensando em fazer um boletim de ocorrência, por tortura, na delegacia local, quando o narrador pediu, uma vez mais, minha opinião sobre a peleja. Não titubeei e disse:
– O craque da partida até aqui, quando estamos nos encaminhando para o final da partida (pouco mais de 30 minutos do segundo tempo), é a bola. Ela está destruindo os jogadores das duas equipes, reage às investidas, marca, arma, ataca e desmoraliza a todos os que estão em campo. É indiscutivelmente soberana no gramado do Iberezão.
Senti-me assim ontem ao assistir América X ABC, por um canal de YouTube, primeira partida da finalíssima do campeonato estadual, com vitória magra do time alvirrubro (1 a 0).
Qualquer pessoa que entenda minimamente de futebol sabe que a bola gosta de ser bem tratada, acarinhada, seduzida. Quem a corteja com gentileza receberá tratamento igual. No entanto, durante 90 minutos ela foi maltratada e reagiu, com desprezo, às tentativas de controle exercidas pelos jogadores dos dois times.
O América venceu porque se dispôs a jogar, a fustigar e a atacar o adversário, que se comportou, como tem sido regra na equipe comandada por Fernando Marchiori, de forma covarde.
O treinador do ABC – que parte da torcida e parte da imprensa servil chamava de Bruxo (não sei se persistirá no servilismo) – envolveu-se há cerca de um mês e meio numa discussão, em programa da 96 FM, com o jornalista Edmo Sinedino, crítico contundente e preciso do modo de jogar implantado por Marchiori.
Marchiori montou ontem, como tem sido regra, o time para empatar: três zagueiros e três volantes. E mesmo quando o placar lhe era adverso persistiu no sistema excessivamente cauteloso, pensando em decidir o campeonato no jogo da volta, no Frasqueirão.
Na coletiva concedida à imprensa ao final do jogo, o treinador do alvinegro de Ponta Negra reagiu com a arrogância e a empáfia dos incompetentes que se sentem acuados, rebatendo, com rispidez e com a mesma deselegância de seus comandados no trato com a bola, um jornalista que cumpria o sagrado dever de um repórter, a saber, perguntar e reportar aos seus leitores, ouvintes ou telespectadores o que testemunhou na Arena das Dunas. Segundo o treinador, a “imprensa estava sendo antiprofissional.” O jornalista que perguntou fez o certo, portanto agiu com correção e rigor profissional e por assim proceder causou desconforto em Marchiori, já acostumado com a subserviência de muitos. Ou deveria esquecer que o ABC não vence a oito partidas e tanto apanha quanto dão nele?
A deprimente partida foi digna do desempenho dos dois lanternas das séries B e C, respectivamente ABC e América, e demonstra o baixo nível do futebol jogado em terras potiguares.
Deveriam todos que estiveram no estádio abrir boletins de ocorrência contra América e ABC. Afinal, tortura é crime.