Luta contra o luto
Perdi meu pai quando era um adolescente de 16 anos e minha mãe quando já era cinquentão a caminho dos 60. No último dia 11 de maio, véspera do dia das mães, foram completados três anos da morte de mamãe.
A proximidade entre as datas me acabrunhou e passei a lembrar, insistentemente, de minha infância, no interior do estado (Florânia) e na avenida Rio Branco, subida do Baldo, para onde nos mudamos, em novembro1975, para que minha irmã, Maria Luiza, então fazendo científico (depois 2º grau e hoje ensino médio), pudesse prosseguir os estudos (à época não era possível cursar o científico em Florânia). Das lembranças frequentes vieram os sonhos, também frequentes, com meus pais, meus avós paternos e maternos, meus primos e amigos de infância.
A semana seguia célere para o seu fim e a celeridade contrastava com a lentidão monótona dos dias sem sim. Estar sem trabalhar, engolido por uma greve que se arrasta há mais de um mês e sem data, no horizonte, para seu fim (quatro anos depois de ter ficado de molho por meses a fio, dos quais sete sem trabalhar, em virtude da pandemia que assolou o mundo) deixa qualquer um agoniado. Envolvo-me com o que é possível (leio, escrevo, cuido de suínos, ovinos e galináceos e da plantação num espaço que tenho nos arredores de Natal, organizo novos projetos para a pós-aposentadoria, etc), mas tudo parece pouco – ou quase nada. Afinal, meu ofício, grudado em mim com força, é lecionar. Cheguei ao topo da carreira dedicando-me sempre ao ensino. Nem quando exerci – coisa que prefiro esquecer por questão de higiene e saúde – funções de gestão, afastei-me de sala de aula. Lecionar é, para mim, a função-mor em qualquer Escola que se preze – ainda que, n’alguns cantos, pôr a bunda em cadeiras que ficam por trás de birôs seja mais enaltecido – e ficar afastado da sala de aula é um tormento.
Voltando ao propósito do texto, a semana corria em grande velocidade e todos que gostamos de esporte, especialmente de futebol, sofremos um baque com a morte de Washington Rodrigues (Apolinho), Antero Greco e Sílvio Luiz.
Washington Rodrigues marcou o início de minha adolescência. Apolinho morreu aos 87 anos, em decorrência de um câncer no fígado, na noite de quarta-feira (15) no intervalo do jogo do Flamengo, time pelo qual torceu e que chegou a treinar, em meados da década de 1990. Sua carreira foi predominantemente na Rádio Globo, convidado pelo grande e inesquecível Waldir Amaral. Lembro dele quando comecei a ouvir, em Florânia, meados dos anos 1970, aos jogos dos campeonatos carioca e brasileiro.
Silvio Luiz, morto aos 89 anos, na manhã da última quinta-feira (16), foi muito importante na transição da minha adolescência para a idade adulta. Com carreira longeva no rádio e na televisão, Sílvio Luiz substituiu Geraldo José de Almeida na Rede Record, em 1976, e inventou um estilo, suprimindo parte dos detalhes que telespectador via e pondo pitadas de descontração e humor nas transmissões. Lembro dele quando já estava na Rede Bandeirantes (hoje Band). Transformava, com seus bordões (“Pelo amor dos meus filhos”, “Olho no lance”, “Pelas barbas do profeta”, “O que é que eu vou dizer lá em casa?”), gracejos e ironias algumas das piores peladas em jogos gostosos de assistir.
Antero Greco, falecido na quinta-feira (16), foi um lorde e, com toda a equipe, deixou-me fiel telespectador, no início da idade adulta já madura (28-30 indo pros 40 anos), da ESPN. Com passagem por vários veículos de comunicação, meu contato com Antero foi, inicialmente, lendo jornal e, depois, na Band, no início dos anos 1990. Mais fortemente, porém, quando Antero ingressou na ESPN e participava do Linha de Passe e, principalmente, insone que sou, acompanhando o SportsCenter, que ele comandava, em parceria com Paulo Soares (Amigão), de forma leve e descontraída. Eu, que sempre gostei de estar em sala de aula nos primeiros horários, e ia madrugada adentro assistindo e rindo com a dupla perfeita para alegrar aos notívagos.
Um amigo o qual reputo um dos nosso maiores cronistas, Rubens Lemos Filho (Rubinho), escrevendo sobre a morte de Leonardo Arruda Câmara, ex-deputado estadual, ex-secretário de estado e ex-presidente do ABC, disse que se sente, aos 53 anos e perdendo amigos “deslocado para a inexistente editoria do obituário, desvelando os falecidos notáveis”. É como me sinto, aos quase 56 anos, quando vejo aqueles com quem convivi partindo para sempre.