As mulheres e o pioneirismo do Rio Grande do Norte

por Sérgio Trindade foi publicado em 04.mar.20

O Rio Grande do Norte foi pioneiro em vários campos. Tivemos Clara Camarão, que lutou contra os holandeses na primeira metade do século XVII; a intelectual feminista Nísia Floresta, dona de obra literária importante e que conviveu, na Europa do século XIX, com grandes pensadores; Auta de Sousa, dona de versos pungentes que impressionaram a fina flor da intelectualidade brasileira do início do século passado; a educadora Noilde Ramalho, que consolidou a obra de Henrique Castriciano, dando envergadura nacional à Escola Doméstica de Natal, erguendo o Complexo Educacional Henrique Castriciano e a Faculdade Natalense Para o Desenvolvimento do Rio Grande do Norte – FARN, hoje UNI-RN; Wilma de Faria, primeira governadora do estado.

Clara Camarão
Noilde Ramalho

Uma das lutas mais renhidas no mundo e no Brasil foi para facultar o direito de voto às mulheres e, neste caso, uma vez mais, o Rio Grande do Norte ocupou a linha de frente.

A partir de 1919, o movimento sufragista brasileiro atuou em um corpo-a-corpo com parlamentares, no Rio de Janeiro, então capital federal.

A mais aguerrida era a bióloga Bertha Lutz, que com várias companheiras conquistaram a adesão de algumas importantes lideranças políticas para a causa, entre as quais o parlamentar potiguar Juvenal Lamartine de Faria.

Bertha Lutz

Fundada em 1922, a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino foi um movimento de âmbito nacional que lutava pelos direitos das mulheres e que tinha como foco principal a conquista do direito ao voto, contando para tal com grupos de mulheres organizadas em todos os estados, inclusive no Rio Grande do Norte.

Juvenal Lamartine de Faria, deputado federal de 1906 a 1926 e senador em 1927-1928, assumiu a governança estadual no Rio Grande do Norte em 1928 (governou o estado por dois anos e nove meses, quando foi deposto pelo movimento revolucionário de 1930) e no cargo se empenhou pela aprovação de legislação estadual que garantisse o voto feminino, fortaleceu o movimento de mulheres durante o seu mandato e trouxe inclusive Bertha Lutz ao estado para promover a candidatura de Alzira Soriano à prefeitura de Lajes.

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Em 1927, a professora potiguar Celina Guimarães Viana se tornou a primeira mulher a ter, quando se inscreveu com outras vinte mulheres, o registro eleitoral aprovado no Brasil, depois de haver requerido sua inclusão no rol de eleitores, em Mossoró, região oeste do estado, cinco anos antes de o voto feminino ser incluído pela primeira vez no código eleitoral brasileiro, em 1932.

Celina Guimarães

Um ano depois, Alzira Soriano foi eleita prefeita de Lajes, na região central, sendo a primeira a ocupar um cargo como esse no país, depois de conquistar 60% dos votos no município. Foi a primeira mulher alçada, pelo voto popular, a um cargo executivo no país. Mas o seu mandato foi cassado, pois a Constituição Federal de 1891 trazia uma ambiguidade, ao não excluir nem incluir explicitamente as mulheres entre os eleitores.

Alzira Soriano

Os dois fatos só foram possíveis porque no Rio Grande do Norte foi, durante a gestão de Juvenal Lamartine, promulgada lei eleitoral que determinava, em seu artigo 17, que poderiam votar e ser votados, sem distinção de sexos, todos os cidadãos que reunissem as condições exigidas pela lei – ser alfabetizado e maior de 21 anos.

A norma permitiu mulheres de Natal, Mossoró, Acari e Apodi alistarem-se como eleitoras em 1928.

O voto de Celina e o de outras eleitoras pioneiras foram anulados pelo Senado. Apesar o texto constitucional estabelecer que seriam eleitores os “maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei”.

Sufragistas e alguns juízes entendiam que o termo “cidadãos” compreendia homens e mulheres, por isso requeriam e por vezes obtinham o registro de eleitora ou candidata. O Senado da Primeira República (1889-1930), porém, apontou que “cidadãos” dizia respeito somente aos homens.

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Em 1934, o Rio Grande do Norte também elegeu a primeira deputada estadual pelo voto direto no Brasil.

Nascida na cidade de Currais Novos, filha do coronel Vivaldo Pereira, irmã do futuro governador Cortez Pereira e noiva e futura esposa do futuro deputado federal Aristófanes Fernandes, Maria do Céu Pereira Fernandes, eleita para a Assembleia Legislativa aos 24 anos, com mais de 12.058 votos, pelo Partido Popular, era uma mulher à frente do seu tempo.  

Durante o seu mandato, conquistado numa eleição marcada pela violência, a parlamentar realizava congressos feministas nos quais defendia a participação política das mulheres. O seu mandato foi abreviado pelo golpe de estado que Getúlio Vargas deu em novembro de 1937.

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