Médici: o ufanista esquizofrênico
O governo do presidente Emílio Garrastazu Médici representou o ápice da opressão e repressão.
Nunca se censurou, sequestrou, prendeu e torturou tanto quanto no governo do gaúcho nascido em Bagé.
Sérgio Cabral, pai, jornalista e historiador de nossa música, disse certa vez que Médici foi possivelmente o “pior período da História do Brasil, desde Pedro Álvares Cabral”, pois durante o seu governo “as pessoas eram mortas, eram torturadas, havia um mínimo de liberdade, as pessoas desconfiavam umas das outras”.
Quando Rubens Paiva, deputado federal cassado, foi preso e desapareceu nos porões do regime, a família procurou o general Cordeiro de Farias, líder militar histórico, para que intercedesse junto ao presidente. O ex-tenente, revolucionário nos anos 1920-30, disse estar afastado de Médici por que se recusava a falar com assassinos.
Paradoxalmente, o presidente mais opressor entre os cinco generais-presidentes do período inaugurado em 1964 foi o que menos recorreu ao Ato Institucional 5 para cassar mandatos (Castelo Branco e Figueiredo não tiveram em mãos o AI-5, o primeiro foi presidente antes da vigência do famigerado estatuto, enquanto o segundo foi presidente quando o Ato havia sido extinto).
Os anos Médici foram marcados por um delírio ufanista só comparável aos anos Lula.
Enquanto censurava, torturava e matava, o governo caprichava na propaganda, apresentando um Brasil que caminhava às mil maravilhas. Músicas (“Todos juntos vamos, pra frente Brasil, salve a Seleção…”; “Este é um país que vai pra frente”) ou slogans (“Brasil: ame-o ou deixe-o”) mostravam um país que dava certo, ainda que o presidente mesmo dissesse que “O país vai bem, mas o povo vai mal”.
Médici nunca foi dado à leitura. Sabia do que ocorria no Brasil por meio do informe matinal que recebia do Sistema Nacional de Informações, órgão criado pelo general Golbery do Couto e Silva e que depois o qualificou como monstro.
Homem de poucas luzes, como próprio Ernesto Geisel, seu sucessor, qualificou-o, Médici era conhecido pelo preguiça e utilizava grande parte do seu tempo jogando biriba e ouvido jogos de futebol. O apego dele ao glorioso esporte bretão era tal que o pôs entre um dos poucos presidentes, talvez o único, a passar no teste do Maracanã, tal a sua popularidade entre as classes C e D, advinda, em grande medida, das ótimas notícias econômicas.
Durante o seu governo, o crescimento brasileiro era de tal ordem que o período ficou conhecido como milagre brasileiro, capitaneado pelo seu ministro da Fazenda, Delfim Netto.
No período o país apresentou taxas de crescimento econômico que variavam entre 8% e 14% anuais, a inflação era relativamente baixa, as exportações cresceram quase 300% e as reservas internacionais aumentaram quase 2500%. O saldo negativo foi o aumento da dívida externa, que saltou de 3,2 bilhões para 8,5 bilhões de dólares.
Por Sérgio Trindade