O futebol nas dunas: nasce o estádio Juvenal Lamartine
O Plano Geral de Sistematização de Natal, de 1929, pretendia reordenar, segundo o professor Pedro de Lima, a cidade, incluindo o Plano da Cidade Nova (Petrópolis e Tirol) e parte do atual Alecrim, construindo uma cidade-jardim e um “bairro operário”, proposta reiterada, em 1935, no Plano de Expansão de Natal, exceto o que estava proposto para o “bairro operário”.
O parque da cidade-jardim estaria localizado no espaço entre “a rua Ceará-Mirim e avenidas Rodrigues Alves, Alberto Maranhão, Prudente de Morais, Alexandrino de Alencar e Olinto Meira” e a cidade-jardim à “oeste delimita-se com o Rio Potengi, à nordeste e à leste com o oceano Atlântico e, ao sul, com uma encosta que na sua parte sudeste se torna bastante íngreme”.
Nesta cidade do início do século XX, o antigo e o moderno vão se dar as mãos. Com bairros pensados em gabinetes e nascidos em pranchetas, o futebol, então esporte de elite, no entanto, era praticado em espaços considerados impróprios, segundo Everaldo Lopes “verdadeiros descampados, com os torcedores isolados por cercas de madeira”.
O futebol, em Natal, surgiu com alguma organização ao final da primeira década do século XX, quando foram fundados o Natal Football, o Potiguar Football e o Atheneu Football Club, formados pela fina flor da sociedade natalense.
O esporte era praticado em Natal desde 1905. Eram verdadeiros “rachas” disputados por jovens e ocorriam em campos (grounds) em praças e terrenos baldios. O primeiro jogo do qual há registro ocorreu, diz Everaldo Lopes, na praça André de Albuquerque, que durante certo tempo foi o campo por excelência da cidade, até que as partidas começaram a ocorrer nas praças Pio X (onde hoje é catedral metropolitana) e Pedro Velho (praça Cívica).
Em 1915 foram fundados o ABC e América, que se enfrentaram pela primeira vez no dia 26 de setembro do mesmo ano, no campo da praça Pedro Velho. A partir, os dois clubes dividiriam a cidade e, depois, o estado em duas cores – preto e vermelho.
Como os campos eram de terra, igual em quase todas as cidades brasileiras, jogadores e espectadores chamavam a prática esportiva de futebol de poeira.
O jornalista Everaldo Lopes afirma, em seu livro Da bola de pito ao Apito Final, que o governador Juvenal Lamartine foi convidado em fevereiro de 1928 para dar o “pontapé inicial” de uma partida na Praça Pedro Velho e ficou penalizado com as limitadas instalações do campo, surgindo daí a decisão de construir um estádio, para o qual o governador, segundo Itamar de Souza, “contribuiu com vinte contos, além de outras ajudas”, o que ensejou a formulação de proposta conduzida por Enéas Reis, presidente do ABC, aprovada por unanimidade, para que a Liga de Desportos, sob a presidência do professor Luiz Soares, designasse o estádio com o nome do primeiro mandatário do estado. Everaldo Lopes registra que o governo do estado arcou com 74 contos, emitindo títulos da dívida pública estadual.
A proposta era construir o estádio na última avenida da Cidade Nova, como registra Itamar de Souza: “No final da década de 20, a avenida Hermes da Fonseca ficou ainda movimentada ao ganhar, em 1928, dois centros de lazer: O Stadium de futebol ‘Juvenal Lamartine’ e o Aero Clube”.
O terreno escolhido pertencia a Romualdo Galvão e foi descoberto como adequado para prática do futebol por meio de informações de “pegadores de passarinhos”. A empreitada não teve sucesso inicialmente, mas dada a insistência de Vicente Farache. Romualdo Galvão acatou a possibilitou de o ABC assumir o campo, posteriormente entregue à Liga Norte-Rio-Grandense de Desportos, para que “grandes encontros pebolísticos” fossem possíveis.
O Estádio Juvenal Lamartine foi inaugurado no dia 12 de outubro de 1928 (a data inicialmente escolhida era 30 de setembro), numa solenidade que contou com a presença da elite natalense. Os homens com chapéus de palhinha e as mulheres com vestidos longos e chapéus com grandes abas. Coube ao governador responsável pela obra e que emprestou o nome ao novo equipamento urbano dar o pontapé inicial do primeiro jogo, entre ABC e Cabo Branco (PB).
Com o novo estádio, carinhosamente chamado de “O campinho do Tirol”, o futebol natalense entrou definitivamente no século XX, acompanhando o processo de modernização da cidade.