O marinheiro Agenor Maria
Estamos, Arthur Dutra, Túlio Lemos e eu, por sugestão e sob coordenação do primeiro, organizando uma série histórica, para o rádio, sobre eleições majoritárias no Rio Grande do Norte. O primeiro episódio será sobre o pleito de 1982, que pôs Aluízio Alves e José Agripino Maia frente a frente.
Quando tive a primeira conversa com Arthur sobre o assunto, lembrei do primeiro comício que vi em Florânia, em 1974, quando Agenor Maria foi candidato a senador pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido de oposição ao regime autoritário instaurado em 1964, contra Djalma Aranha Marinho, então deputado federal pela ARENA (Aliança Renovadora Nacional).
A disputa era praticamente para formalizar resultado que todos aguardavam, tendo em vista que ninguém acreditava que Agenor Maria pudesse vencer Djalma Marinho, um dos parlamentares mais respeitados do país. O próprio Djalma Marinho fez pouco caso do adversário: “Eu não tenho paciência para ensinar e tampouco o que aprender com Agenor Maria.”
Agenor Nunes de Maria nasceu em São Vicente, em 1927 (o ano de nascimento foi registrado como 1924 para garantir o seu ingresso na Escola de Aprendizes de Marinheiro no início dos anos 1940), quando o município era parte de Florânia, Seridó potiguar (https://coisasdeflorania.wordpress.com/2011/09/28/floraniense-e-vicentino-das-nossas-coisas/). Depois que saiu da Marinha passou por várias ocupações (agricultor, funcionário do Instituto Nacional do Sal, comerciante, etc). Ingressou na vida pública em 1954, como vereador em São Vicente (mandato renovado em 1958) e depois, em 1962, chegou à Assembleia Legislativa pela Aliança Democrática Trabalhista, coligação formada pela União Democrática Nacional (UDN) e pelo Partido Social Trabalhista (PST). Integrou os quadros da ARENA em 1965 e conseguiu, em 1967, uma suplência para a Câmara de Deputados, abandonando a vida pública em 1969, chateado com a cassação de Aluízio Alves, mas voltando à luta em 1972, quando ficou em terceiro lugar na disputa pela prefeitura de Currais Novos. Derrotado, abandonou mais uma vez a política.
Na ocasião, o MDB vinha de duas derrotas fragorosas, em 1966 e 1970, e o partido estava a tal ponto atarantado que uma ala, posteriormente batizada como autêntica, defendia a autodissolução como forma de denunciar a todos que o Brasil vivia num regime ditatorial. Os moderados (como a ala que se opunha aos autênticos ficou conhecida) pregavam que o partido deveria permanecer atuando. O presidente do partido, Ulisses Guimarães, tendo companheiro de chapa o jornalista Barbosa Lima Sobrinho, percorreu o país como anticandidato a Presidente da República, com o objetivo de engajar o MDB nas eleições legislativas que se avizinhavam.
Aqui no Rio Grande do Norte, a ARENA elegeu, em 1970, os dois senadores, Dinarte Mariz e Jessé Freire. Os governadores eram eleitos indiretamente (1970, 1974 e 1978), com as chances da oposição sendo varridas, porquanto a ARENA controlar, com folga, a bancada na Assembleia Legislativa.
A conjuntura política desfavorável criava dificuldades para o MDB arranjar alguém disposto a disputar uma eleição, para o Senado, praticamente perdida, tendo em vista a ARENA já ter se definido pelo nome Djalma Marinho, parlamentar experiente e atuante e que se transformou num nome nacional quando, presidindo a Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara de Deputados, negou licença para o governo federal processar o deputado Márcio Moreira Alves, em 1968, fato que foi o estopim para Costa e Silva assinar o Ato Institucional nº 5 (AI-5), o mais duro instrumento legal baixado pelo regime.
O advogado Varela Barca, o vereador Érico Harcrkradt e o padre José Luiz foram alguns dos nomes sondados, no entanto todos recusaram-se a ir para o abate eleitoral, até que as lideranças emedebistas foram resgatar Agenor Maria em Currais Novos, onde vivia depois da derrota de 1972, trabalhando como agricultor e comerciante, para ser candidato a senador, em 1974. A derrota ficou ainda mais clara, menos para o candidato oposicionista convicto da vitória: “Difícil é convencer o MDB dessa possibilidade. Vou ganhar pedindo voto aos eleitores da ARENA”.
Apesar (talvez justamente por isso) de ser um homem rude e de pouca instrução, Agenor Maria era uma pessoa que conseguia se comunicar muito bem com o homem do povo que, como ele, também era pouco instruído. Denunciava a pobreza e o abandono dos mais necessitados, do agricultor e do estado, de modo geral, e batia na tecla do “aumento da carestia e do arrocho salarial”.
Nos anos 1970, papai era um dos líderes do MDB em Florânia, do MDB que cabia num Fusca, expressão que nasceu para se referir à minguada base parlamentar do partido eleita para a Assembleia Legislativa, em 1970.
Lembro que meu pai me contou certa vez que quando a caravana do MDB chegou, durante a campanha de 1974, à cidade para comício que se realizaria à noite, Agenor Maria saiu andando pelas ruas e conversando com todo mundo que podia. À noite, o candidato a senador, sintonizado com os moradores da pequena urbe seridoense, falava exatamente aquilo que era anseio do povo. Desta forma e com âncora tatuada no braço (lembrando o seu tempo na Marinha) e embalado por um hit de sucesso (https://www.youtube.com/watch?v=4FzTT4EkkE0), Agenor Maria derrotou o deputado federal Djalma Marinha na disputa senatorial, passando oito anos na câmara alta, somando 212.635 votos (52,54%) contra 192.048 (47,46%).