Política e famílias (1)

por Sérgio Trindade foi publicado em 22.jun.24

Ser político requer o desenvolvimento de certas habilidades, entre elas o hábito de conversar e se relacionar com as pessoas. Segundo Pierre Bourdieu, isso é crucial para obter o reconhecimento social que torna alguns indivíduos mais aceitos como atores políticos e, portanto, capazes de agir politicamente.

A família exerceu um papel fundamental na formação da sociedade brasileira, oriunda do domínio patriarcal do período colonial. Nesse contexto, a figura do pai era a principal autoridade, o chefe de família responsável por proteger a propriedade por meio de laços de parentesco. Dessa forma, criavam-se redes de solidariedade entre os grupos desde os primórdios. Casamentos e apadrinhamento eram formas de fortalecer esses laços familiares, constituindo a família como o pilar para a organização da sociedade brasileira, inclusive para a entrada na política.

Para Letícia Canêdo, no belíssimo trabalho Caminhos da memória: parentesco e poder, as famílias políticas têm papel essencial na transmissão do poder, pois atuam na acumulação de capital político trabalhando na mobilização dos laços familiares, na socialização política, formando competências necessárias ao exercício da atividade política (uso da oratória, aproximação de grupos políticos e sociais que possam somar votos, presença em atividades públicas, etc) e na construção de representação simbólica por meio da edificação do poder simbólico e do poder político da família, além da promoção do “conhecimento e do reconhecimento do patrimônio familiar” e da criação de  “redes estruturadas pelo sentimento de identidade comum e obrigações afetivas” utilizadas para acumular e transmitir o patrimônio político familiar. Do ponto de vista histórico, diz a mesma autora em outro texto (Um capital político multiplicado no trabalho genealógico), que a “ocupação de posições dominantes na esfera política brasileira vem sendo descrita pelos estudiosos como uma progressiva substituição de antigos bacharéis, com seus conhecimentos de direito constitucional, por indivíduos que combinam conhecimento técnico sofisticado com sensibilidade política.”

No Brasil republicano, o oligarquismo de base familiar predominou até recentemente, com muitos estados controlados por grupos familiares. Esse padrão ainda persiste em alguns estados, como o Pará, onde a família Barbalho exerce influência há décadas.

No Rio Grande do Norte, durante a República Velha, o controle político ficou nas mãos de duas famílias: Albuquerque Maranhão e Bezerra de Medeiros. Após a redemocratização, três grupos familiares assumiram o comando: Mariz, Alves e Maia. Outras famílias, como Ferreira de Souza, Rosado, Arruda Câmara e Fernandes e Rêgo, também desempenharam papéis importantes no estado. Pelo interior, grupos familiares continuam dominando seus redutos e perpetuando seus herdeiros.

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