Descompasso educacional
O texto que segue é do professor de Filosofia, Luiz Roberto.
Caro amigo Serju!
Li, outro dia, o texto que vosmicê escreveu sobre a pseudo pendenga que existiria entre policiais e professores. Discussão esta ocorrida por conta de uma prova realizada no colégio Marista, para alunos do 9º ano.
Como sempre, gostei de muitas coisas que foram expressas ali e discordei de diversas outras. No entanto, apesar de causar um certo pânico, para a maioria dos professores, mencionar tema tão tenebroso, que levaria a tão discutida doutrinação nas escolas, não é sobre esta abordagem que quero me deter.
O que tenho para falar envolve docência, professores, alunos, escola, enfim, tudo isso aí. Contudo, não é aquilo lá.
É claro que não sou um mago da educação. Nem com o mestre dos magos pareço, para que o fosse. Também não uso barbas, nem pareço com um bom velhinho. Definitivamente, não sou um douto em educação. Outrossim, tem coisas relacionadas à educação tão prosaicas, que até eu consigo entender, e gostaria de falar sobre elas. Também queria saber de vosmicê porque estas coisas são tabus, pois não vejo os educadores falando sobre elas.
Olha, sei que o IFRN não é o centro do mundo da excelência acadêmica. Em verdade, está muito, mas, muito distante disso. Mas vá lá, se trabalhamos com educação no IFRN, podemos, então, falar alguma coisa sobre educação. Isso significa também que o IFRN, de uma certa forma, é o centro do nosso mundo acadêmico.
Tendo posto tudo isso aí na conta, eis alguns fatos.
Estamos sem qualquer tipo de aula desde o dia 17 de março de 2020. O calendário acadêmico foi suspenso, mas já apontada retomada, há algumas semanas, a despeito de toda grita ao redor.
Não recordo ao certo, talvez tenhamos começado a nos debruçar sobre o retorno às aulas, de forma on line, há uns 60 ou 70 dias. Entretanto, apesar de já termos marcado uma data para o retorno, ainda não fizemos isso. Faremos no início de outubro. O que irá perfazer quase sete meses sem aulas.
Junte-se a isso o fato de que a prefeitura de Natal já deu permissão para que as escolas particulares retornem às aulas presenciais.
Ainda mais importante que tudo isso, a garbosa OMS, junto à UNICEF, recomendou que as aulas presenciais devem ser retomadas ao redor do mundo, quando houver condições. (https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2020/09/14/oms-com-medidas-adequadas-reabertura-de-escolas-nao-agravou-pandemia.htm). Ou seja, o que está dito aí é que governantes e gestores educacionais devem ser prudentes.
Prudência é a palavra de ordem. Pois, crianças e jovens fora da escola representam um problema com dimensões colossais. E parece que muitos não se dão conta disso. Preferem se focar nos filigranas burocráticos, antes de pensar em sua função referenciada socialmente, que é a função do profissional da educação.
Em todos os lugares é possível ver e ouvir as pessoas, especialistas, não especialistas, médicos, enfim, uma miríade de profissionais, falando da urgência do retorno às aulas presenciais, com todos os cuidados e protocolos possíveis. Não tive o azar de perceber ninguém defendendo um oba-oba escolar, que objetivasse apenas tirar crianças e jovens de dentro de casa.
Tendo mencionado tais fatos, vou agora ao ponto fulcral do meu raciocínio.
Se o mundo todo fala do retorno às aulas presenciais, com anuência daqueles dois notórios órgãos mencionados acima, por que nós do IFRN ainda nem conseguimos, pelo menos, começar as aulas on line? É impressão minha ou perdemos o bonde da história? Culpamos a todos e a tudo, mas esquecemos de nos colocar em compasso com o resto do mundo.
Inclusive, vi, outro dia, o Secretário de Educação do Paraná dizendo que no estado dele as aulas on line estão dando muito certo, desde o início de abril. Pelo que percebi, inferindo o que este digníssimo senhor falou, sobre as maravilhas das aulas on line, ocorridas no estado do Paraná, quase fiquei convencido que o ensino on line é a melhor coisa do mundo. É a solução de todos os problemas. Juro que para mim só faltou ele mencionar que este modo de EAD substitui perfeitamente a escola presencial.
Daí, me surge outra dúvida, pois percebo especialistas, e não especialistas também, falando o tempo todo que a educação on line, preenche um vácuo, mas não é uma solução peremptória para a educação básica.
É, talvez o Secretário lá só esteja representando um papel de político, daqueles que constroem encômios sobre suas próprias realizações.
Então, noto que entre o ufanismo do Secretário de Educação do Paraná com as aulas on line e a retomada das aulas presenciais, indicadas, entre outras instâncias, pelas notabilíssimas organizações internacionais, nós não conseguimos realizar ainda o caminho, supostamente, menos drástico.
O que resta para nós?
Somos caros para a sociedade. É fato! E, pelo que estou vendo, corremos um sério risco, por responsabilidade única e exclusiva nossa, de nos tornarmos obsoletos. E aí, qual o futuro?
Já vi articulistas dizendo que os professores das escolas públicas tiraram um ano sabático em 2020. Por mais absurdo que isto nos soe (tal qual terno risca de giz em baile de carnaval), são coisas como essas que são ditas por aí. Nós vamos simplesmente ignorar e achar que estamos acima do bem e do mal? Que quem estar fora das paredes da escola não pode opinar, apesar destas pessoas confiarem, de boa fé, seus filhos a nós.
Me assusta tudo isso, porque vejo até manifestos contrários sobre o início das aulas on line no IFRN. Vale dizer, extremamente demagógicos. De sorte que há quem sugira, ou que verbalize mesmo, que os que desejam as aulas logo querem deixar uma porcentagem dos alunos para trás.
Estes, que sugerem ou dizem isso, se dão uma autoridade vestal para julgar o anseio de trabalho de uns, diga-se de passagem, referendado socialmente, pela pior régua moral possível. São incapazes de pensar, ou quiçá, admitir que retornando às aulas conseguiremos voltar ao mínimo de normalidade possível no momento e, quem sabe, dar mais celeridade ao processo de absorver os alunos sem acesso aos meios informacionais necessários para tanto.
Eis, que me dou o direito de realizar uma admoestação!
A vocês, justiceiros!
É importante que fique destacado que ninguém é insensível aos problemas, ou barreiras, postos. Apenas soluções diferentes são propostas. Ao passo que os senhores preferem focar de antemão na condenação das pessoas, denegando os processos que estas propõem. Silenciando quem pensa diferente e proferindo gritos de: Pega o Opressor!!! Outros, talvez, prefiram focar na busca por soluções, independente das pessoas que propõem.
Enfim, sabendo que talvez estejamos apenas no fim do começo, e torcendo para que não seja o começo do fim, tenho ânsia por descobrir o que precisamos fazer para começar a pensar no retorno às aulas presenciais, ainda que seja apenas nos protocolos, os quais deveremos seguir rigidamente, quando for chegada a hora daquelas retornarem no IFRN, vez que as aulas on line estão na iminência de começar.
Ou será que vamos fazer o que viemos insistindo em fazer: dar as costas para o mundo, quando a exigência que vem de fora da bolha nos é desconfortável ou inconveniente. Pode ser que optemos por este duplo padrão, já que há alguns meses repetíamos que deveríamos seguir a OMS e a ciência.
E agora? A quem vamos seguir?