Sobre tropeços e erros (Ou ao amigo Luiz Roberto)
Prezado Luiz,
Agradeço, inicialmente, por ter enviado ao blog suas impressões sobre o que ocorre no Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, bem como os elogios destinados a este simples e quase simplório matuto criado entre as serras do Seridó, as chapadas oestanas e as praias de Natal. E, adianto, que eles, os elogios, não me impediram de discordar muitas vezes, mesmo concordando algumas outras, de vossência.
Os meus poucos leitores perceberão na tabelinha que fiz ao responder às suas provocações.
Vosmicê diz que indiquei “bons caminhos a serem percorridos” para que possamos sair da crise na qual está enfiado hoje o IFRN. Os caminhos só bons e são lógicos, ainda que não vistos, nem com lentes de aumento, por quem quer prolongar uma briga política da qual somente o IFRN, e os alunos, ressalto, sairá perdedor.
As nossas discordâncias (minhas e suas), mais até do que nossas concordâncias, creio que você sabe disso, têm sido salutares para o desenvolvimento de nossas conversas rotineiras “sobre uma gama variada de assuntos: doença, Estado, política, família, convivência, insanidade e, provavelmente, com mais força, de abril para cá, sobre a realidade que insiste em se desdobrar sobre o IFRN.” Assim penso, porque identifico as concordâncias que se sucedem monotonamente como areia que emperra e destrói a engrenagem de qualquer pretensão intelectual.
Dito isto, passo a “responder” as questões-cascas-de-banana que você me enviou:
1) Temos um Reitor Pro-tempore, ou Interventor, como muitos dizem?
Isso é uma questão menor, pois como Reitor Pro-Tempore ou como Interventor, Josué responde institucionalmente pelo IFRN. Se há quem queira manter a arena política movimentada, que o faça sem prejudicar o andamento das questões administrativas e pedagógicas.
2) O atual Reitor tem demonstrado certa inaptidão política, como apontado por vosmicê. Será que é por ter sido colocado em um cargo para o qual ainda não estava preparado?
Estar apto para funções administrativas e políticas exige algum tipo de treinamento ou vivência e está claro que tem faltado as duas coisas ao atual Reitor. Isso pode ser resolvido com o tempo. A questão é: será que o tempo que ele terá será suficiente? Suspeito que não. De qualquer forma, enquanto durar sua permanência à frente do IFRN, o que devemos fazer? Atrapalhar os passos dele? Sabotá-lo? Assim procedendo, como ficará a instituição?
Convocar reuniões extraordinários sem-fim, com o objetivo de paralisar a administração, como fizeram membros do Conselho Superior (CONSUP), não era, como eu cheguei a dizer, uma forma eficaz de combate, mas uma infantilidade administrativa, que um dia poderia ser usada, de várias maneiras, contra o próprio CONSUP. Carregar o Regimento do CONSUP embaixo do braço para provocar com inutilidades o Reitor ou Interventor era um tiro que poderia sair pela culatra, pois um dia conselheiros cometeriam algum erro regimental que os deixariam nus. Foi o que ocorreu. A gestão descobriu um errinho, uma filigrana normativa não cumprida, a saber, a não-leitura da ata da reunião anterior no início de cada sessão e que existiam dez, isso mesmo dez atas não feitas e portanto não lidas e assim determinou que todas as reuniões só ocorreriam após a elaboração e leitura de todas as atas. E por que existiam tantas atas não feitas? Porque tornou-se esporte favorito de alguns conselheiros convocar reuniões extraordinárias para desfilarem seus egos. Bem, regimentalmente as atas teriam de estar prontas e todas deveriam estar lidas e assinadas, para que as reuniões do CONSUP pudessem ocorrer. Até lá, decidiu o Reitor, as decisões seriam tomadas pelo presidente do CONSUP… o Reitor. Que usou a burocracia para engolir a burocracia.
A burocracia dos conselheiros infantilizados voltou-se contra eles e inviabilizou o CONSUP, sob o olhar atônito de todos, inclusive dos que deveriam conhecer o Regimento do Conselho do qual fazem parte.
Pensar na instituição antes de qualquer outra coisa é, como disse no texto que escrevi dias atrás, ter espírito público. Entre outras coisas, isso exige que nos dispamos da vaidade de não sermos muita coisa e pensarmos que somos o centro do mundo. Se sairmos da bolha veremos que grande parte da sociedade não sabe o que ocorre dentro dos muros do IFRN. A esmagadora maioria das pessoas não sabe a diferença entre Reitor pro-tempore e Interventor. E não sabem porque não se interessam por saber. Muita gente, todos com quem conversei e converso, fora das duas bolhas que se formaram no IFRN não sabe nada sobre o processo político que resultou na escolha e no impedimento da posse do Reitor eleito e na escolha de outro para ocupar, interinamente, o cargo. A maioria dessas pessoas não entende porque, sendo uma escola de ciência e tecnologia, o IFRN não consegue viabilizar aulas remotas. A justificativa de que ninguém pode ficar para trás é verdadeira como uma nota de 7 reais.
3) Estamos caminhando a passos largos para cinco meses sem aulas, por conta da pandemia.
Não é uma pergunta. Quando você formulou o raciocínio íamos para cinco meses. Hoje vamos para seis meses. Já li e ouvi colegas e amigos dizendo que nós não estamos sem trabalhar, pois estamos orientando, participando de reuniões, fazendo treinamento, etc. Talvez estejamos fazendo tudo isso aí, que é um complemento de nossa atividade docente, mas sejamos sinceros, o essencial de nossa atividade docente, que é lecionar, não estamos fazendo. E não conseguiremos convencer a sociedade escondendo de nós o que nós somos. Mentir ou omitir informações é um mau caminho.
4) A instituição está política e administrativamente dividida?
Não tenho elementos para responder a pergunta com precisão. A oposição a Josué diz que ele tem ao lado dele 3%. O número, pelo que visualizo, é o percentual que o professor Ribeiro, hoje Pro-Reitor de Ensino, teve de votos quando foi candidato a Reitor. Repito: a arena política pode ser tomada por arnobistas, josuelistas, democratas, autocratas, libertários, liberais, comunistas, etc, sem que a vida administrativa da instituição seja prejudicada.
5) Vivemos inescapável falta de consenso institucional?
Sinto que entre os colegas de bom senso há um consenso institucional. Já dizia um político tradicional destas terras: para se decidir as coisas é preciso que se faça com senso e não por consenso. O senso de responsabilidade indica que não é possível fazer revolução financiada com dinheiro público. O “Posse do Reitor Eleito” e o “Fica Josué” podem continuar, desde que às margens do expediente administrativo. Em outras palavras: no horário do expediente todos trabalham em prol da instituição e da sociedade que nos paga. Encerrado o expediente, cada um pega sua bandeira e vai fazer movimentação política. Quem não quiser, como eu, vai para casa.
6) Foi aberta uma sindicância, ou PAD, não sei ao certo, contra o reitor eleito – José Arnóbio – salvo engano, em janeiro. Alguém abriu o tal processo motivado por um fato do mundo real e, talvez, também, por um fato (ou desejo) político.
Corre ou está parado a sindicância/PAD. A origem de tudo está aí. Tenho suspeitas que estão pra lá de Josué sobre o motivo que ensejou a abertura tardia da sindicância/PAD. São só suspeitas e, por ora, não tenho como demonstrar. Tendo mais elementos, aventurar-me-ei no assunto.
7) Esta última questão está se desenrolando no ambiente jurídico, portanto, foge do nosso controle.
O campo de batalha mesmo é no campo jurídico ou no campo político. O professor José Arnóbio só assume, pelo que vejo, por dois caminhos: a) se a justiça assim determinar ou; b) se o governo federal aceitar. Em outras palavras, o imbróglio será resolvido pela via judicial ou pela via política. Como as coisas estão se desenrolando, um ou outro elemento pode acelerar o processo, mas não será determinante. Exceto se ocorrer algo excepcional.
8) Nós – servidores – trabalhamos para a instituição, logo, para os pagadores de impostos, ou seja, toda a sociedade.
Você já diz o que penso: “Não trabalhamos para este ou aquele reitor, ou gestor, especificamente falando. Estes, os gestores, gerenciam a instituição”. Penso o seguinte: seja Lula, Dilma, Temer ou Bolsonaro o Presidente da República, seguirei servidor público. Seja o Reitor Belchior, Wyllys, Arnóbio ou Josué, seguirei servidor público. Minhas queixas não serão debitadas na conta da instituição na qual trabalho. Lembro de um caso que ocorreu comigo, quando era diretor acadêmico no campus Santa Cruz e estava fazendo as vezes de diretor geral, na ausência do professor Erivan Amaral. Recebi uma pessoa no campus que solicitava que fizéssemos campanha para Dilma, então ameaçada pelo crescimento de José Serra, candidato do PSDB, nas pesquisas de opinião. Eu descartei a possibilidade dizendo que o IFRN não era (não deveria ser) curral eleitoral de partido algum. Devemos satisfações à sociedade que nos paga. É assim que penso e é assim que ajo. Isso, tenho certeza, desperta raiva e mesmo ira em alguns desmiolados. Não me angustio e não me intimido com isso. Sigo dizendo e agindo como sempre fiz.
9) As pessoas, principalmente certos grupos bastante barulhentos, estão atacando outras pessoas, não as ações, nem as ideias, inclusive por meio de ameaças.
Eu soube que sim. Um colega chegou a ser ameaçado de morte pelas redes sociais. Eu, que assistia tudo à distância, fui associado, por colegas, à trama que alçou Josué ao comando do IFRN. Não fui bater boca com ninguém nas redes sociais. Acionei o meu advogado e interpelei três colegas. Se eu puser as mãos num material que correu em um grupo de um aplicativo de mensagens, outras oito pessoas serão interpeladas. O que virá daí não sei. Eu aconselharia a todos que foram atacados pela tchurma do ódio do bem a fazer o mesmo que eu fiz.
10) Aparentemente temos duas gestões, uma da reitoria, outra dos DG´s, o que tem se mostrado um tanto ou quanto deletério.
Ouvi um graduado oposicionista a Josué, sem função alguma na instituição, dizer em mais de um veículo de comunicação do estado que tem liderado grupos de trabalho para pôr ordem na casa. A fala do fulano é indicativa do que pode estar sendo feito. Se o trabalho é para garantir a volta da normalidade administrativa, ótimo. Não sendo, temo pelo que ocorrerá. Eu não digo nada e nem dou ideia.
11) Vários grupos se dão ao direito legítimo de fazer resistência à ação do MEC. A referida resistência parece feita com dinheiro público.
Você já adianta o que penso. É legítimo o direito de fazer oposição e resistência. Desde que com financiamento privado. Sou favorável a qualquer manifestação política pacífica, sem que a sociedade a financie com dinheiro de impostos, portanto fora do expediente administrativo.
12) Se não fosse indicado, como reitor pro-tempore/interventor, o monsieur Josué, tal fardo não poderia recair sobre um outro indivíduo, inclusive também podendo tal indivíduo ser externo à instituição?
O governo federal quis intervir e o fez com as armas que tinha. Errou na tática e na estratégia. O erro do governo, é sempre bom ressaltar, ocorreu porque houve dois erros internos: a) do diretor geral do campus Natal Central, como está posto no processo que corre e; b) o Reitor que antecedeu Josué parece ter convenientemente demorado para abrir sindicância e investigar o tal evento da Igreja com barraquinha “Lula Livre”.
13) Se a resposta for positiva para questão anterior, como imagino, continuaríamos atacando as pessoas, como estamos fazendo, ou iríamos tratar de questões mais urgentes e esperaríamos para resolver o problema causador da tensão atual na instância devida, qual seja, na justiça?
Boa pergunta. Suspeito que a arena política estaria conflagrada, mas não com a mesma intensidade.
14) É salutar misturarmos o assunto da pro-temporalidade, ou intervenção, às questões fundamentais, como a volta às aulas, ou isso só aumenta o chafurdo, nos levando para um lodaçal de problemas?
Lembrando Juarez Soares, o China: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. As aulas não deveriam estar no mesmo pacote da luta política. O “Fica Josué” e o “Posse do Reitor Eleito” devem existir sem que alunos e sociedade paguem a conta.