Pelé, o deus mortal
Há duas semanas, no palco do sorteio dos jogos da Copa do Mundo, estava lá, Ele, de cadeira de rodas.
No Brasil, misturamos Pelé e Édson. Ele sempre os separou. O mundo todo os separa. Sim, porque Pelé, o atleta, é divino; Édson é humano demais, cheio de defeitos.
Pelé sempre foi maior, muito maior do que o homem Edson Arantes do Nascimento. Foi uma das primeiras personalidades globais do século XX.
O que o Brasil tem de boa imagem lá fora deve, em grande medida, ao futebol, e ao futebol a partir de 1958, quando Ele debutou para o mundo. Por isso mesmo, Pelé deu sentido à palavra “brasileiro” em todos os quadrantes do mundo.
Contribuiu de forma decisiva para a construção de identidade brasileira, ao lado de Garrincha criou uma escola de futebol que era (talvez ainda seja) reverenciada em todos os cantos do planeta. E isso, amigos, não é pouco.
Ver Pelé, o bailarino velocista, vivendo a velhice que chega para todos nós, doeu demais. Eu mesmo nunca consegui, até por esses dias, ver ou sentir o fim do rei, do “deus de todos os estádios”, na feliz definição de Jorge Cúri ao narrar o primeiro dos gols do Brasil, feito por Pelé, na goleada final contra a Itália, na Copa do Mundo de 1970.
Tite, que é sem favor o melhor treinador do Brasil na última década e meia, subiu mais ainda no meu conceito.
O atual treinador da seleção brasileira disse que fez questão de abraçar Pelé, durante o sorteio das chaves pra copa do mundo, e agradecê-lo por ser brasileiro. E completou: “Pelé é de outra dimensão”.
Concordo com Tite. Pelé é um ser superior. Mesmo numa cadeira de rodas exala majestade.
O maior atleta do século XX envelheceu e, estou pasmo (!), é mortal. Aquele ser humano que fez coisas magistrais correndo, anda sentado numa cadeira de rodas, sendo conduzido pra cima e pra baixo por terceiros. Um dos maiores brasileiros de todos os tempos e um dos grandes ícones globais do século XX, o gênio da percepção, da sensibilidade e do improviso, tão superior a todos os demais que chocava, ainda está entre nós.
Que siga assim por muito tempo.
Abandonemos a mania de o maldizê-lo. Aproveitemos para venerá-lo.
Por Sérgio Trindade