Boulos e as inovações científicas e tecnológicas do MTST

por Sérgio Trindade foi publicado em 16.mar.23

Assisti vídeo do deputado federal Guilherme Boulos enaltecendo dois fantásticos e inovadores projetos do coletivo Quebrada Agroecológica, ligado ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), do qual ele é um dos dirigentes/incentivadores: a construção de cisternas e de casas de taipa. Estas, na maior cara de pau do deputado paulista, chamadas de casas bioconstruídas. Em dado momento, Boulos diz que o projeto foi premiado pela Organização das Nações Unidas (ONU) (https://www.youtube.com/watch?v=7k4bbwoZWKk). Lembrou-me como alguns projetos de pesquisa são selecionados e premiados em instituições de ensino.

A colunista Madeleine Lacsko escreveu belo texto, na Folha de São Paulo, questionando o limite do fetiche da elite urbana por miséria (https://noticias.uol.com.br/colunas/madeleine-lacsko/2023/03/15/qual-o-limite-do-fetiche-da-elite-urbana-por-miseria.htm).

Palavra originária do latim cisterna, de cista, “caixa” e do grego κίστη (kistē), “cesta”, a cisternas são reservatórios utilizados para armazenar líquidos, geralmente água e, desde sua origem, foram construídas para coletar e armazenar água da chuva (https://www.ecocasa.com.br/cisterna-um-patrimonio-da-humanidade/).

Segundo Paul Kriwaczek (Babilônia: a Mesopotâmia e o nascimento da civilização), Pierre Lévêque (As primeiras civilizações: da idade da pedra aos povos semitas), Edward M. Burns (História da civilização ocidental, volume 1), entre outros, os povos do oriente próximo ou médio conviveram (e convivem ainda hoje) com a escassez de água e precisaram desenvolver variadas tecnologias para ter acesso ao precioso líquido. Provavelmente, a tecnologia das cisternas nasceu e se desenvolveu a partir da região, certamente no Levante, por volta do ano 5. 000 a. C. e a construção era feita sob as casas para armazenar água para diversos fins. Com o tempo, a cisterna tornou-se crucial no manejo de água nas comunidades agropecuárias.

A escassez de água potável é uma realidade em muitos lugares. No sertão nordestino é uma constante, dada a irregularidade das precipitações pluviométricas, razão pela qual é muito comum famílias e estabelecimentos comerciais e industriais recorrerem ao uso de cisternas para captar água da chuva, porque elas constituem soluções simples e eficazes como sistema de armazenamento de água. Não são inovadoras, mas, como dito acima, de tecnologia milenar.

A parte do vídeo sobre as cisternas revela um Boulos bobalhão. A que aborda as casas de taipa mostra um Boulos bobalhão e mal-informado (se formos condescendentes) ou intelectual desonesto, afinal graduado em filosofia, pela Universidade de São Paulo  (USP), e filho de um casal de médicos (seus pais são médicos infectologistas), o atual deputado federal psolista não pode dizer que não tem acesso a informações necessárias sobre o assunto.

Como diz Madeleine Lacsko, as casas de taipa “são bonitas em fotografias e têm a vantagem de utilizar materiais e mão-de-obra locais, sendo mais sustentáveis que as de alvenaria”, no entanto há décadas iniciativas são feitas para “acabar com esse tipo de construção porque ela favorece a infecção por doença de Chagas, que gera progressivamente insuficiência cardíaca”, porquanto as paredes serem “feitas de barro e cascalho” e formarem buracos que garantem hospedagem para “o mosquito barbeiro, vetor do protozoário Trypanosoma cruzi, transmissor da doença”. Para reforçar o que diz, a colunista se socorre com o doutor em medicina e pós-doutor em imunopatoligia molecular, Bruno Filardi, para quem há “relação direta entre esse tipo de construção e a doença”.

Lembro de dona Candoca, minha professora no 1º ano primário, em 1974, em Florânia, dizendo que o barbeiro crescia em casas de taipa e era muito perigoso porque fazia o coração crescer até não caber dentro do peito.

É, para dizer o mínimo, bizarro assistir o deputado federal mais votado de São Paulo, segundo colocado no pleito para prefeitura paulistana, em 2018, e apontado como potencial presidenciável, filho de médicos infectologistas, defender, com orgulho, que pessoas residam, em pleno século XXI, em casas de taipa. Ainda há, é certo, gente morando em edificações assim. Não por questões ecológicas, mas por falta de ação eficaz de gestores públicos ou por demagogia de parlamentares como Boulos.

posts relacionados
Logo do blog 'a história em detalhes'
por Sérgio Trindade
logo da agencia web escolar