Memórias das putas sérias – 4

por Sérgio Trindade foi publicado em 21.mar.25

O prédio baixo e estreito, de fachada bem cuidada, estava espremido entre armazéns na parte baixa da cidade. No terceiro andar, uma pequena e estreita sala estreita abrigava três birôs e três cadeiras próximos aos cantos das paredes. Próximo à porta havia uma estante com várias pastas. Todos os móveis eram de madeira crua.

Ali, três homens – um gordo e alto, de gestos lentos, olhos fixos em tabelas e sempre fazendo contas; outro atarracado e de olhos pequenos e perscrutadores, conferia as contas e escrevia sem parar; o terceiro, magro e alto, de fala solene, dissecava as intenções humanas como quem abre cadáveres – moviam-se entre pilhas de papeis.

O gerente, o magro de fala solene, gostava de olhar o burburinho da cidade, por isso vez por outra espichava o olhar pela janela. O silêncio era, para ele, áspero. Expansivo, o magro solene negociava palavras, apesar de suas dificuldades com elas. A sua empresa, a Companhia Potiguar de Exportação e Importação (Copotexim) nasceu sem alarde. Não houve faixas nem discursos. Apenas papeis e lápis, muita boa vontade e, claro, contatos. Afinal, contatos abrem portas.

Ele trabalhava como quem sabem que dinheiro é bom, mas não esquenta lugar. Do jeito que chega vai embora, não tolera mentira. Se se sentir maltratado, tchau, some. Por isso, ele trouxe duas pessoas de confiança para cuidar do escritório e outros mais para tocar os armazéns. E um cabra de confiança, pau para toda obra, para alguma eventualidade.

O gordo alto e o atarracado tinham olhos de lince. Nada lhes escapavam. O primeiro era um mago dos números e o segundo um exímio redator. Os dois produziam relatórios precisos, em linguagem seca e objetiva.

Os fazendeiros e os comerciantes com os quais a Copotexim fazia negócios eram facilmente convencidos pela clareza e objetividade da dupla expert em Matemática e Português. Tanto que os documentos que carregavam a assinatura da dupla passaram a ser conhecidos como MATEPOR.

MATEPOR tornou-se sinônimo de clareza, objetividade, concisão.

O trabalho do gerente era fazer contatos, minerar negócios. Dava pouca atenção à burocracia diária. Sabendo sobreviver em meio a políticos e empresários, distribuía simpatia e frases feitas – e assim novos negócios vinham.

O mercado, cheio de urubus a espreitar novas oportunidades, sabia que o sucesso da Copotexim era explicado pela excelência de seus funcionários, principalmente da dupla MATEPOR e não do seu dono, que gastava o dia paparicando políticos e empresários e desfiando chavões mundo afora.

Sem MATEPOR Copotexim não existiria. Mas o fato é que Copotexim chegou para ficar. Não porque o seu dono falasse mais, mas porque, na penumbra daquela sala no terceiro andar, dois argutos funcionários conduziam os seus destinos – e lhe davam credibilidade.

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