O último Kaiser

por Sérgio Trindade foi publicado em 10.jan.24

Organizados, disciplinados e metódicos, os germanos, paradoxalmente, puseram a Europa e o mundo de pernas para o ar em várias ocasiões, a começar pela invasão e destruição do Império Romano e terminando com a primeira e a segunda guerras mundiais.

Ao final da primeira guerra mundial, fizeram o kaiser (imperador) renunciar e enfrentaram bagunça política e econômica que resultou na ascensão de grupos políticos radicais, entre os quais os nazistas que empalmaram o poder na primeira metade da década de 1930. O resto é história.

Quando a Alemanha saía arruinada da segunda guerra mundial e precisou ser reconstruída, o último kaiser alemão nascia em Munique, a 11 de setembro de 1945. Pouco mais de uma década à frente (1966) sentou no trono e ali foi soberano absoluto por mais de dez anos.

Franz Anton Albert Beackenbauer tem nome, sobrenome, postura e altivez de rei. E se não teve sangue azul para ser “von” foi por um capricho do destino, para sorte de todos nós que amamos futebol, o espaço geopolítico por ele ocupado, dentro e fora de campo – como jogador, treinador e dirigente esportivo.

Sem ser  “von” mas carregado de nobreza, Beackenbauer foi o maior jogador alemão de todos os tempos. Isso já não seria pouco, mas o bávaro de Munique foi mais. Ganhou duas bolas de ouro, 1972 e 1976, jogando como zagueiro, o que confirma a grandeza do seu futebol; foi duas vezes segundo lugar (1974 e 1975) e uma vez terceiro (1966), a última justamente no ano de sua coroação.

O último kaiser foi um zagueiro com categoria de meia de armação. Reinventou a posição de líbero ao romper com as amarras que deixavam zagueiros como apenas defensores, tornando-se um ponto conclusivo e inapelável na mudança da história do futebol. Em A pirâmide invertida, a história tática do futebol, Jonathan Wilson expõe que “Beckenbauer sempre insistiu que seu estilo ofensivo era resultado de suas atuações como meio-campista pela seleção, na qual Willi Schulz era o líbero – por isso, ele não sentia o desconforto que era comum aos defensores quando avançavam com a bola”.

Além disso, Beackenbauer representou para o Bayern de Munique o mesmo que Pelé representou para o Santos.

O rei do futebol estreou no Santos em 1956, quando o clube era uma potência mediana do futebol paulista. Em cinco/seis anos o time alvinegro já era um dos grandes do mundo.

Quando o gênio alemão estreou no time do Bayern de Munique, só havia na prateleira um troféu do campeonato alemão. Em uma década, os bávaros puseram quatro canecos na sala de troféus e ganharam três Champions League (antiga Copa dos Campeões da Europa), em 1974, 1975 e 1976.

Pela seleção da Alemanha Ocidental, o kaiser foi campeão da Eurocopa (1972) e Mundial (1974). Foi vice-campeão em 1966, perdendo para os ingleses, anfitriões do torneio.

Após pendurar as chuteiras, Beackenbauer foi técnico da Alemanha Ocidental, sendo vice-campeão em 1986, quando perdeu para a Argentina. Em 1990, ainda como técnico, conduziu a Alemanha unificada ao título, dando o troco nos platinos.

Longe dos gramados, como jogador e treinador, tornou-se dirigente do Bayern e manteve a equipe entre os grandes da Europa e líder inconteste do futebol alemão.

No último domingo, dois dias após a morte de Zagallo, um dos três junto com ele a ser campeão mundial como jogador e técnico (o terceiro é o francês Didier Deschamps), Beackenbauer foi se unir a outros imortais do futebol mundial – Pelé, Maradona, Cruyff, Di Stéfano e outros mais – para formar uma seleção imbatível.

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