De ensino presencial a ensino à distância (1)

por Sérgio Trindade foi publicado em 17.abr.20

Escrevi um post, semana passada, numa rede social e recebi investidas contrariamente inflamadas e mal-educadas de uns militontos.

Daqueles que se apresentam como críticos-moralmente-superiores-e-por-isso-guardiões-da-ética-de-todo-mundo.

Sabujos daquela parcela do mundo político que assaltou por mais de uma década os cofres públicos mas que, ainda assim, insistem em se apresentarem como portadores da boa nova da velha moralidade pública.

Os lacaios já me patrulham desde a eleição presidencial última (alguns até antes), porque eu declarei voto branco e, na doentia cabeça deles, era necessário escolher entre a barbárie bolsonariana e civilização haddadiana.

Na minha mediocridade eu só via barbárie. E ainda enxergo as coisas da mesma forma.

Voltando ao tema, o post era uma ironia que pretendo desenvolver como um conto, mas os beleguins tomaram como crítica ao que ocorre realmente no mundo real, perdoem-me a redundância.

A ideia do conto que pretendo escrevinhar veio à minha cabeça após assistir uma série (Chernobyl), uns documentários (sobre os ataques nucleares dos Estados Unidos ao Japão, em agosto de 1945) e reassistir um filme (The day after).

Após uma hecatombe nuclear, um vírus guardado em laboratório começa a se disseminar muito rapidamente e cada país passa por várias fases de isolamento social, do mais atenuado ao mais drástico.

As maiores vítimas são os mais velhos e os mais jovens e, portanto, as escolas são as últimas a voltar às atividades normais, obrigando-as a se adaptar aos novos tempos e, durante o percurso, utilizando as mais variadas artimanhas para dizer que fazem o que não fazem.

Um pouco parecido com o que vivemos.

Este o ponto central do conto.

Alguns amigos vieram comentar, educadamente, no meu post – discordando e concordando – e instaram-me a escrever algo sobre o que está realmente ocorrendo, a saber, a eficácia de transformar o ensino presencial no ensino à distância na atual conjuntura.

Aceitei o, digamos, desafio e fui ler sobre o assunto, para tentar dizer alguma coisa lógica.

Adianto, o que há neste texto não tem relação alguma com o conto que escreverei.

Limitar-me-ei a escrever sobre o que ocorre no IFRN, porque vivo proximamente a realidade.

Também acompanho com certo interesse o que ocorre na UFRN, sem porém saber de maiores detalhes.

O texto ficou grande demais e, por isso, eu o dividi em duas partes.

Quando a Covid-19 entrou de vez no nosso cotidiano, grande parte da população leiga, assustada com o que ocorria na Ásia e na Europa, foi mais rápida na reação ao fato do que especialistas.

A UFRN, com base em parecer de um comitê de especialistas encarregado de acompanhar o assunto, resolveu, dia 16 de março, manter as aulas normalmente.

O IFRN, com base em parecer de um comitê de especialistas encarregado de acompanhar o assunto, resolveu, dia 16 de março, manter as aulas normalmente.

No IFRN, a decisão foi tomada, segundo correspondência interna que circulou em mídia virtual, pelo Colégio dos Dirigentes (CODIR), instância administrativa colegiada que insiste em decidir, em flagrante desrespeito à lei que criou os Institutos Federais.

Dia 17 de março, meio manhã, a UFRN decidiu suspender as aulas; o IFRN, por volta de 11h.

O IFRN suspendeu o calendário acadêmico por tempo indeterminado, conforme documentos oficiais, da própria instituição e do Ministério da Educação. Ou seja, não pode haver aula alguma. Presencial ou à distância.

Mesmo com a impossibilidade de ocorrer qualquer forma de aula, seria de esperar que houvesse um debate qualificado sobre as possibilidades futuras de fazê-las à distância, pois parece que o corona não nos deixará tão cedo.

No entanto, não é o que visualizamos.

Vejo experiências desenvolvidas por vários colegas, algumas bem arrojadas e diria que exitosas. Tudo, porém, feito no peito e na raça, sem qualquer orientação pedagógica.

Educação não é, nunca foi e certamente nunca será atividade essencial e em momentos como este pelo qual estamos passando, o ensino fica quase que inteiramente à margem dos debates públicos.

É da vida real, e não muito o que possa ser feito para mudar esse estado de coisas, pois o importante, para o momento, é evitar que pessoas fiquem e morram e alimentá-las da melhor forma possível.

Muito embora a modalidade de ensino à distância esteja sendo aplicada no ensino básico (fundamental e médio), as experiências que vejo em três escolas privadas (duas acompanho proximamente) de Natal são um faz-de-conta, um arremedo, pois não há controle algum da frequência dos alunos e tampouco da realização das atividade solicitadas.

E não é responsabilidade apenas dos professores.

Professores estão sendo transformados, sem treinamento algum, em espécies de youtubers que gravam, produzem e editam material sem qualquer acompanhamento pedagógico.

Ora, a esmagadora maioria dos profissionais que estão em sala de aula pelo país foi formada para atuar no ensino presencial, não no ensino à distância. Se querem que estejam aptos a atuar no ensino à distância, é preciso prepará-los para isso.

Alguém me dirá: mas isso leva tempo e nós precisamos dos professores em sala de aula imediatamente.

Ok, o imediatamente poderia aguardar uma ou duas semanas, até que houvesse uma preparação básica que permitisse aos docentes atuarem, com certa desenvoltura, na nova modalidade.

Professor merece respeito, e não pode e não deve ter sua imagem exposta irresponsavelmente.  Depois, quando a fatura vier, escolas tiram o braço da seringa e o responsável pelos erros será o professor – por fazer o que não sabia.

Enquanto Escolas particulares – mesmo algumas públicas – aceleraram, sem muito critério, a adoção do ensino à distância, o IFRN, com a justificativa de que a maioria dos alunos não tem acesso, em casa, a computadores e a internet, anda a passo de cágado.

A suspensão do calendário acadêmico, repito, impede a realização de aulas à distância e, se elas ocorrerem, não têm validade alguma e portanto não podem ser registradas no sistema acadêmico da instituição. Isso, entretanto, não inviabiliza a busca por caminhos que permitam, de forma responsável, científica e profissional, o ensino à distância.

Há gente boa encontrando soluções para a sinuca na qual as escolas estão.

Era de esperar que estivéssemos arregaçando as mangas para fazer o mesmo.

No próximo texto (este já está longo demais) direi minha ideia, que é velha, e já foi sugerida em outro momento (mais precisamente em 2016) a gestores institucionais e farei todas as críticas que fiz, faço e farei à condução da instituição, sempre que perceber erros.

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