Eu não como frieira

por Sérgio Trindade foi publicado em 29.set.17

Já corriam dez anos que o país vivia sob regime autoritário.

Nove unidades da Federação, entre elas Pedrobolândia, sofriam os efeitos terríveis de uma das mais longevas secas.

O governo federal resolveu convocar uma reunião de emergência do órgão encarregado de contornar os efeitos mais graves da estiagem, a Coordenadoria de Desenvolvimento do Sul (CODESSUL).

A reunião ocorreria na capital mais importante dos nove estados que compunham a região sul do país.

Delegações dos estados castigados pela seca para lá se dirigiram.

Naquele ano, seria presidida não pelo presidente da CODESSUL, mas pelo próprio presidente da República, que abriria e fecharia o encontro.

Para variar, pouco se resolveu que pudesse amainar o sofrimento de quem vivia castigado pela seca inclemente. Os almoços e jantares, no entanto, foram de gala, “supimpas”, como disse um deslumbrado que marcava presença nestes convescotes pela primeira vez.

O almoço do último dia foi um banquete de fazer inveja à corte de Luís XVI, o monarca que perdeu a cabeça na esteira da Revolução Francesa.

Garçons desfilavam por entre as mesas servindo pratos finos, quase nenhum da cozinha regional. Lá pras tantas, um deles dirige-se ao Secretário de Agricultura de Pedrobolândia e pergunta-lhe se desejava experimentar um quitute, e estende-lhe a bandeja com uns cogumelos gratinados, prontamente recusados pelo ilustre e boa-praça agente do governo pedrobolandês:

– Obrigado, meu filho, mas eu não como frieira.

Disse isso e virou as costas ao desconcertado garçom, que aceitou mas ficou sem entender o motivo da recusa.

 

Por Sérgio Trindade

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