Experimentos mentais

por Sérgio Trindade foi publicado em 22.jan.24

Os experimentos mentais remontam, em filosofia, aos gregos antigos e, na física, aos trabalhos de Galileu Galilei, mas o conceito Gedankenexperiment (experimentos mentais) foi popularizado por Albert Einstein, constituindo-se narrativas que nos convidam a imaginar e avaliar uma situação hipotética.

Bastante utilizados na investigação filosófica para elucidar determinada concepção ou até mesmo para apoiar ou refutar alguma proposição ou teoria, os experimentos mentais são raciocínios lógicos sobre um experimento não realizável na prática, mas cujas consequências podem ser exploradas pela imaginação e utilizados para se compreender aspectos não experimentáveis. Einstein utilizou do meio para explorar algumas das consequências da teoria da relatividade, descrevendo a sua abordagem de usar experiências conceptuais e não experiências reais.

O físico e historiador da ciência Friedrich Hund escreveu um trabalho (Paths to quantum theory historically viewed), em meados do século passado, segundo o qual uma infinidade de caminhos seriam possíveis para chegar às diferentes fases do desenvolvimento da teoria quântica.

Contrafactuais são perguntas que começam por “e se”, feitas diariamente como forma de refletirmos sobre as consequências das ações dos agentes históricos.

Em história a contrafactualidade é um experimento mental, pois há consenso de que fatores fortuitos afetam o desenvolvimento do percurso histórico. Logo, muitas outras histórias seriam possíveis, e não somente esta que vivemos. No entanto, como a ciência histórica lida com o passado e o passado foi exatamente como foi, os historiadores geralmente mantêm distância da história contrafactual, sob o argumento de que não há uma maneira direta e segura de investigar histórias possíveis que não ocorreram.

Acompanhando o desenrolar do conflito entre Israel e alguns de seus vizinhos no Levante e as manifestações pró e contra o Estado judeu, recorro aos experimentos mentais para fazer um exercício de contrafactualidade.

O que ocorreria se Israel não mais bombardear e retirar suas tropas da Faixa de Gaza? E se desativar os seus assentamentos na Cisjordânia, como já fez na Faixa de Gaza? E se libertar todos os prisioneiros do Hamas, da Jihad Islâmica, do Hezbollah e de qualquer grupo que comete ou apoia atentados terroristas contra israelenses, inclusive reconhecendo-os como detentores de direito para montar governo na Faixa de Gaza e na Cisjordânia? E se o parlamento de Israel remover o governo populista-autoritário de Netanyahu, colocando em seu lugar um governo democrático-liberal e acertar todos os atrasados, indenizando os palestinos pelas perdas alegadas? O que ocorreria? Nasceria na região um Estado palestino na região que reconheceria a existência legítima do Estado de Israel? Acabariam os atentados e ataques a Israel e os israelenses viveriam em paz e em segurança? Cessaria o antissemitismo no mundo? Ou nada disso seria suficiente se Israel não se dissolvesse como Estado, e os judeus se dispersassem mais uma vez pelo mundo?

O problema dos problemas complexos, como os do Levante, é que não há soluções fáceis. A paz ali não seria alcançada numa mesinha com cervejas e petiscos, como já insinuou candidatos a estadistas. Esforços de décadas têm sido empreendidos por muita gente boa e preparada e a cada dois passos para a frente, um é dado para trás. E é assim que história caminha, passo-a-passo. Com e sem atropelos.

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