Natal, não há tal

por Sérgio Trindade foi publicado em 25.jan.23

Tomo emprestado o título do trabalho organizado por João Gothardo Dantas Emerenciano (Natal, não há tal: aspectos da história da cidade do Natal) para escrever sobre a fundação da cidade, em texto que bebe no trabalho Ecos do silêncio, de Walner Barros Spencer.
Estava passeando, ali próximo a 25 de dezembro, pela internet e me deparei com alguns textos sobre a fundação de Natal, no Rio Grande do Norte.
A fundação de Natal e o que veio na esteira do fato é parte que integra de maneira intensa e profunda a formação histórica do Brasil, dado não ser, como registra Walner Barros Spencer, na obra acima citada, “consequência natural do desenvolvimento de um povoado, ou direito adquirido por antiguidade de povoamento, serviços prestados ou desenvolvimento econômico”, mas estratégia construída para garantir a “manutenção do domínio luso-espanhol da colônia ainda incipiente e da prevenção da conquista de territórios cobiçados por outras nações europeias”; foi “ordem direta, de cunho geopolítico” da Coroa, um “dever de fazer vinculado a ato político” para assegurar “não só o uso, mas a posse e o domínio da terra”.
Há poucos paralelos na história brasileira. Talvez só João Pessoa se aproxime como evento histórico por aqui.
A situação na capitania do Rio Grande era, desde o início, delicada em virtude da presença francesa, que, em associação com os índios potiguares e com seus aliados, os tabajaras, da vizinha Paraíba, assolava a região e inviabilizava a sua conquista pelos portugueses.
Os franceses efetuavam escambo de mercadorias europeias por produtos da terra, especialmente pau-brasil, e aproveitavam para descansar e reabastecer as embarcações com água e comida, após o que atacavam instalações portuguesas na Paraíba.
Inúmeros historiadores (Varnhagen, Câmara Cascudo, Tavares de Lyra, Rocha Pombo, entre outros) dão conta da aliança entre os franceses e os nativos, bem como das incursões gaulesas ao território paraibano e dos reveses que causavam. Até mesmo Jerônimo de Barros, filho do donatário da capitania do Rio Grande, menciona que, como citado Cascudo, que “os franceses todos os anos vem a ela carregar de Brasil por ser o melhor pau de toda a costa” e fazem “casas de pedra em que estão na terra fazendo comércio com o gentio” e, assim, conclui Cascudo, ficava inviabilizado o comércio regular lusitano nessa área. Logo, era urgente inviabilizar e mesmo impedir a atuação dos franceses que, segundo Spencer, a continuar poderia “findar em posse da terra”. Ademais, a conquista da região não era interesse particular, “mas porque esta esquina norte-oriental do continente era a chave do prosseguimento da conquista ibérica no litoral norte do Brasil” e tal “consideração estratégica, cuja consecução resultou na construção do Forte dos Reis Magos e na fundação da Cidade de Natal, foi de suma importância na posterior formação territorial brasileira.”
Para confirmar, citando Diogo de Menezes (A Razão do Estado do Brasil), Spencer conclui que “a posição geográfica da fortaleza permitia que ela olhasse ambas as costas deste Estado, assim a do norte e do sul, como a de leste a oeste”, além de, como assevera Capistrano de Abreu, ter encurtado a “distância ao Maranhão e Amazonas” e convertendo a capitania (do Rio Grande), conforme Jânio Quadros e Afonso Arinos, citados por Spencer, em “ponto de irradiação do povoamento do Nordeste no rumo do alto Maranhão e do Amazonas” e, ainda, segundo Roberto Simonsen, garantindo maior segurança para a Paraíba.

Em suma, a fundação de Natal firmou o pé dos portugueses no litoral norte e permitiu o avanço da fronteira setentrional do Brasil, configurando o mapa do país por estas bandas.

posts relacionados
Logo do blog 'a história em detalhes'
por Sérgio Trindade
logo da agencia web escolar