O novo velho e o velho novo

por Sérgio Trindade foi publicado em 17.out.24

A história da novo e do velho na política nunca colou, para mim. Mas está aí de novo a novidade (perdoem-me o trocadilho), trazida à baila por analistas e eleitores de Natália Bonavides, candidata do PT à prefeitura de Natal.

Lavoisier, o francês que viveu no século XVIII, desvelou a lei da conservação de massas, segundo a qual em um sistema fechado, a massa dos reagentes de uma reação química é igual à massa dos produtos. Ou seja, no mundo nada se cria ou se perde. tudo se transforma.

Vale para o mundo natural, vale para o mundo social – e se assim é, a regra exposta como lei ajusta-se à perfeição à política.

Já li e ouvi muito sobre novo e velho na política. E não me refiro à idade.

Fui educado ouvindo nas salas de aula que a oligarquia A isso, a oligarquia B aquilo, a oligarquia C aquilo outro. Tudo era culpa das oligarquias, na terra do jerimum, famílias.

E todas as correntes que maldiziam as oligarquias sonhavam, no íntimo, substituí-las para fazer aquilo que elas faziam: mandar, perseguir adversários e utilizar a estrutura de mando para ter acesso a regalias e para se perpetuar na máquina pública.

Aqui, para ficarmos na província da nossa prostituída república, a máquina foi dos Albuquerque Maranhão, dos Bezerra de Medeiros, dos Alves, dos Maia, dos Rosado… e agora é disputada por alguns renitentes que um dia privaram da amizade destas famílias e por uma elite parida na máquina sindical e de seus braços no funcionalismo público municipal, estadual e federal associada à militância das pautas identitárias.

Um dia Bezerra de Medeiros, Alves, Maia, Rosado se apresentaram como novos e modernos mesmo tendo sido comensais do arcaico e do velho.

Isso não é novo na história.

Júlio César foi aliado de “velho” Mário (o pai de Mário, que também era Mário, casara com Júlia, irmã do pai de Júlio César, logo este era primo-irmão daquele) e se abraçou com o “velho” Pompeu e o “novo” Crasso. Morto, surgiram os “novos” Marco Antônio e Otávio brigando por seu espólio, numa sucessão de “novos” nascidos politicamente de “velhos”.

O jovem general Napoleão Bonaparte foi o “novo” que veio, ao final do século XVIII, para sepultar definitivamente o antigo regime, o qual teimava em não morrer após 10 anos de revolução. Cinco anos depois estava Napoleão sagrando-se imperador e brincando de ser Luís XVI, tendo Talleyrand, político extremamente hábil e astuto, figura carimbada dos decaídos, entre seus mais destacados auxiliares. Uma espécie de arquétipo do traidor, tendo Talleyrand esteve, após a derrota de Napoleão, à serviço da nova ordem que perseguia o corso e pretendia sepultar tudo o que ele e a revolução à qual ele serviu criaram. Quando de sua morte, em 1838, Victor Hugo escreveu que Talleyrand “esteve à frente de duas revoluções e serviu a 20 reis, enganando a todos”. Há quem conteste e registre que ele era um adepto da realpolitik, um homem que ajustava as ideias às circunstâncias – em suma, um pragmático.

Em 1950, disseram que Getúlio Vargas estava velho para voltar ao Catete. Ele voltou nos braços do povo e embalado pela marchinha Retrato do Velho, de Haroldo Lobo, derrotando o jovial brigadeiro Eduardo Gomes, o homem que deu nome ao docinho de chocolate (https://www.letras.mus.br/haroldo-lobo/691758/).

Em 1985, Paulo Salim Maluf, candidato do regime autoritário que agonizava, chamou Tancredo Neves, seu adversário, de velho. O sábio mineiro rebateu: “O jovem Nero botou fogo em Roma e o velho Churchill conduziu à Grã-Bretanha à vitória na segunda guerra mundial”.

Tancredo, o velho que se fez novo na campanha, carregou gente nova e arejada para o ministério e um museu de novidades, algumas aplicadas serventuárias do regime que morri e o qual ele combatera e ajudara a encerrar.

Natália Bonavides é bem mais jovem, na idade, do que Paulinho Freire. Mas algumas de suas pautas não são modernas, são só woke – muitas delas, por sinal, responsáveis pela deputada petista patinar em quase 58% de rejeição.

O partido de Natália segue agarrado a teses caducas e a utopias regressistas. Parte de seus dirigentes, incluindo o presidente Lula, estão na pista há três ou mais décadas, e pouco trouxeram de novidade estruturais e modernizadoras para o país e para o estado. E Lula segue se apresentando como homem de povo, apesar de compor a elite política brasileira há mais de quatro décadas.

Penso que Natal ganhou com a exclusão de Carlos Eduardo do processo eleitoral. Ele nada tinha mais a oferecer à cidade, enquanto Natália e Paulinho têm, provavelmente, pretensões políticas maiores, sendo Natal uma vitrine importante para ambos. Este é o ponto, e o eleitorado, parece, caso sejam confirmados os números que boa parte dos institutos de pesquisas divulgam, inclina-se por Paulinho e rejeita Natália.

Um amigo me disse que Natália é rejeitada porque “o eleitorado é conservador, fascista, etc”.

Eleitorado bom e progressista para meu amigo só existe quando o partido e o candidato de seu agrado são vitoriosos.

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