Intoleráveis intolerantes
Um amigo, inteligente, leitor voraz e observador atento da cena urbana mundial e brasileira e com o qual gosto de discutir e de quem gosto de divergir, diz abertamente que a esquerda, especialmente a que vem dando o tom das discussões no campo ideológico, perde terreno rapidamente porque o produto que tem para oferecer é ruim e no ambiente de comunicação instantânea no qual vivemos não consegue engrupir muito mais gente, só os fanatizados, os desmiolados e os encargados.
Essa esquerda faz bobagens em série e as divulga com orgulho e depois estranha os motivos que levam as pessoas a votar em políticos como Donald Trump, segundo a patota um selvagem da incorreção política.
Sempre há, em qualquer lugar, um progressista de dedo em riste acusando alguém de racista, misógino, transfóbico, fascista e exigindo que seja condenado, demitido, excluído, eliminado. São os monopolizadores da virtude. Os virtuosos de placenta. Geralmente proclamam: “Fulano não pode ter feito isso, ele é de esquerda”, “Sicrano não é homofóbico, ele é de esquerda”. Só a direira erra, pensam os mimosos.
Um dia essa pantomima identitária geraria revolta. O dia chegou, e o politicamente correto é sentido como uma forma de opressão e quem a ele se opõe passa a ser visto como libertador. Assim, Trump é um libertador para quase todos aqueles que têm medo da fúria identitária e dos seus procedimentos de atribuição de culpas e distribuição de punições.
Há outras coisas, claro, no entanto basta olhar rapidamente no que o presidente dos EUA investe e alardeia para constatar que ele colocou a extinção do politicamente correto e da pauta identitária como emblemas de campanha e está implementando-a.
No Brasil, o caso da cantora Cláudia Leite é um exemplo típico da opressão identitarista. E patrocinada pelo Estado, via ministério público.
A cantora se converteu a outra religião e na cosmologia da sua nova crença orixás não existem e, portanto, não devem ser mencionados. Não concordo com ela, entretanto reconheço que tem o direito de crer e descrer no que quiser. Como os que cultuam orixás também têm o direito de crer e descrer. No entanto, os identitáros querem punir a moça, processando-a e impedindo-a de cantar.
Acusam-na, intolerantemente, de intolerância religiosa. E propõem punição dura: querem impedir uma cantora convertida de seguir o seu novo credo e de continuar cantando.
Não gosto de Cláudia Leite, de Daniela Mercury, de Ivete Sangalo e de outras do mesmo time da axé. Não sou fã de axé e acho risível essa coisa de crenças religiosas que não podem pronunciar o nome de entidades e de deuses das crenças dos outros. Mas isso faz parte da aceitação de religiões. Tolerância é isso e não obrigar o outro a fazer o que não quer e puni-lo por “desobediência”.
Há uns dias venho, por desobediência ouvindo Cláudia Leite. Tem presença de palco, é boa intérprete e boa voz. E é bonita. Muito bonita. Linda mesma!