Roma e Rômulos

por Sérgio Trindade foi publicado em 13.abr.22

Roma não teve apenas um fundador, mas dois. Em momentos diferentes e decisivos de sua história.

É sobejamente conhecida a história dos gêmeos Rômulo e Remo, amamentados por uma loba.

A imagem da loba amamentando os irmãos é tão marcante e tão marcantemente reproduzida que segue sendo a que simboliza as origens de Roma, século VIII a. C. É umas das lendas históricas mais fortes da fundação de qualquer cidade em qualquer momento e em qualquer parte do mundo, mas é um mito, afinal uma loba amamentando duas crianças é um evento para lá de estranho. Ressalte-se que não existe apenas uma história de Rômulo e Remo. São várias versões. No geral, prevalecem os elementos decisivos expressos na lenda tradicionalmente conhecida.

Tito Lívio, tentando racionalizar o episódio, diz que os gêmeos foram lançados no rio Tibre, para que se afogassem, e foram colhidos por uma loba, que os amamentou. Adendo: a palavra latina para loba é lupa, coloquialmente usada para indicar prostituta. Depois de recolhidos pela lupa, as crianças foram criadas por um pastor e sua esposa (seria a lupa?) e, anos mais tarde, encontram o avô Numitor, rei deposto pelo usurpador Amúlio, a quem restauram o reinado e partem, em seguida, para fundar uma nova cidade. Divergem sobre o local e, segundo Lívio, a briga resulta em conflito aberto, com Rômulo matando Remo e tornando-se o único senhor do local.

Monte Palatino, local da fundação de Roma.

Diz a tradição que Rômulo e os cidadãos dessa pequena comunidade estavam em luta com os sabinos, seus vizinhos, no local em que mais tarde seria erguido o Fórum, centro político da Roma republicana no seu auge. Como os romanos estavam enfrentando muitas dificuldades, retirando-se do campo de batalha, Rômulo orou a Júpiter Stator, o “que mantém os homens firmes”, e prometeu que, em caso de vitória, ergueria um templo em agradecimento, conforme registra Lívio. Não há qualquer vestígio arqueológico do tal templo. O fato demarca, como já acontecera com a rivalidade Amúlio e Numitor e Rômulo e Remo, as lutas fratricidas entre povos vizinhos e, de certa forma, aparentados.

Do final do século V para o início do século IV a. C., há relatos de novos conflitos decisivos para o futuro de Roma. O primeiro deles, em 396 a. C., quando a cidade de Veii, grande rival de Roma, foi vencida após algumas décadas de lutas descritas como algo equivalente à guerra de Tróia, com cerco de dez anos para capturar a cidade etrusca e com os vitoriosos romanos aparecendo dentro da cidade inimiga por um túnel cavado até o templo de Juno, algo semelhante ao cavalo usado pelos gregos para invadir Tróia. Certamente a guerra e a conquista foram muito mais modesta, porquanto Veii ser, de alguma forma, uma cidade próspera, um pouco menor que Roma, de quem estava afastada por apenas dezesseis quilômetros, com ambas bem distantes de serem duas grandes potências econômicas e militares.

A vitória sobre os samnitas, na sequência, após quase um século de guerra, tornou Roma a principal base de poder na Itália e, portanto, alvo de vários outros povos e cidades. Tanto que gauleses errantes (provavelmente um grupo formado por mercenários) pôs para correr o exército romano, nas proximidades do que veio a ser a cidade eterna, tomaram-na e a saquearam. Os efeitos foram devastadores. Segundo Tito Lívio, Roma teve praticamente de ser reconstruída e refundada, sob a liderança de Marco Fúrio Camilo, uma espécie de segundo Rômulo, provavelmente tão lendário e mítico quanto o primeiro.

Algumas marcas indicam fragmentos dessa invasão gaulesa e da refundação de Roma, entre as quais o vasto muro de defesa da cidade feito com pedra durável, o temor dos romanos de que uma nova invasão pudesse se efetivar a partir dos Alpes e a construção desordenada da urbe, transformada numa espécie de labirinto mal planejado.

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